Páginas

30 de out. de 2019

PRECISAMOS FALAR SOBRE AS FÉRIAS!

O governo Eduardo Leite (PSDB e comparsas) pretende reduzir os serviços público às cinzas. Está na mira não apenas o plano de carreira do magistério estadual, mas uma série de ataques que, se consolidados, significarão a transformação do RS no Chile (o paraíso neoliberal que se tornou o inferno na terra para os trabalhadores) sob a supervisão do ministro bolsonarista, o chicago boy, Paulo Guedes.

Após uma assembleia geral morna e um congresso estadual que não sintetizou nenhuma experiência de luta e não encaminhou nenhuma mobilização real, ficou apontado apenas que, se o governo enviar para a Assembleia Legislativa o projeto de destruição das carreiras, em 72h será deflagrada uma greve (não sabemos quais serão as condições até lá e, tampouco, que espécie de comando ou fundo de greve haverá - se é que haverá algum!). O tempo vai passando entre muitas incertezas e já estamos quase no final do ano. A pressão imediatista de grande parte da nossa categoria se faz sentir, sobretudo, no que diz respeito às férias. Há a possibilidade real do governo Leite enviar o seu pacote entre o natal e o ano novo (incluindo o cenário de uma convocação extraordinária nas férias).

Por tudo isso é necessário debater um problema que surge de nossas compreensões imediatistas. Isto é, aquele problema que cria concepções sindicais bizarras, como, por exemplo, fazer paralisação ou greve sempre se preocupando com “recuperar em janeiro”; trocando em miúdos: isso significa que a preocupação com as férias é maior do que com a gravidade da situação que nos leva a deflagrar uma greve. Em síntese: grande parte da categoria (com a bênção do CPERS) quer uma luta de faz de contas, rápida, com garantias de vitórias sem esforço! Esse pensamento está disseminado a tal ponto em nossa categoria que o governo e a mídia comercial sabem perfeitamente jogar com ele.
         
Não são poucas as “preocupações” dos dirigentes sindicais do CPERS que visam “paralisações” e “greves” previsíveis e com dias determinados para datas próximas dos finais de semana ou de feriadões. O seu objetivo é claro: lotar os atos de rua com uma massa útil. Será possível derrotar governos decididamente empenhados em nos retirar direitos, que além de tudo contam com o apoio da grande mídia e do empresariado, fazendo uma “luta” com esta disposição e estado de espírito?

Se queremos uma greve maciça com possibilidade de vitória, temos que começar a debater tais problemas, sem o quê é praticamente impossível criarmos um verdadeiro exército pra enfrentar a guerra que o CPERS supostamente declara contra Leite. Nada disso está sendo debatido nas visitas às escolas. O trabalho de base da direção central consiste em exposições jurídicas daquilo que todos já sabem, mas sem nenhuma preparação concreta, com debate sobre organização, comando de greve, bandeiras, propaganda, agitação, formas de aproximação com a comunidade escolar e elevação real do espírito de luta. Apesar da justeza da luta contra a destruição do plano de carreira, não há bandeira para os contratados (pior do que isso: não há a menor preocupação em relação a isso). No lugar, sobrevém apenas ataques pessoais de setores contra setores. Uma nova derrota da consciência de classe.
         
Compreendemos que o problema das férias é outro calcanhar de Aquiles. Ele deveria estar sendo debatido abertamente nesse trabalho de base nas escolas e não apenas o proselitismo jurídico. A questão é: sem enfrentar o problema das férias, corremos sério risco de sofrer um golpe do governo Leite, com a total destruição do plano de carreira na semana de recesso ou em janeiro e fevereiro. Para nós, o plano de carreira é mais importante que as férias! Devemos estar conscientes e mobilizados, com suficiente espírito de luta para sacrificá-las este ano se necessário for.

20 de out. de 2019

A MILITARIZAÇÃO DA ESCOLA PÚBLICA É A SUA DESTRUIÇÃO PEDAGÓGICA

We don't need no thought control


Está em curso no Brasil a aplicação de um projeto do governo federal que visa militarizar as escolas públicas. São as “escolas cívico-militares” – uma espécie de “menina dos olhos” do governo Bolsonaro (PSL e comparsas) e dos seus apoiadores. Grande parte dos governadores estaduais abraçou a proposta com entusiasmo, uma vez que o governo federal reservou uma generosa verba de R$1 milhão por escola para custear os gastos com a contratação de militares da reserva, que são parte fundamental da proposta deste projeto.
         A medida do governo Bolsonaro sinaliza um avanço na militarização da sociedade, que é parte do seu programa político e do seu odioso culto ao regime militar de 1964. Nos primeiros nove meses do mandato de Bolsonaro, a quantidade de militares em postos do governo federal aumentou em pelo menos 325 pessoas, passando a marca de 2500 “funcionários” que detém cargos de chefia ou assessoria em cerca de 30 órgãos de governo.
Ainda que o Projeto de Lei “Escola sem Partido” (ESP) tenha sido engavetado, ele preparou o terreno para o avanço do militarismo sobre a educação pública que agora acompanhamos. Num texto de 2015, afirmamos que o objetivo do ESP era “aterrorizar, desmoralizar e desmobilizar”; e concluíamos: “Mesmo que o PL não venha a ser votado e formalmente aprovado, o seu objetivo já está sendo atingido; qual seja: intimidar e coagir as posições de esquerda dentro da escola pública e evitar que professores solicitem apoio aos alunos para uma greve ou mobilização contra o governo. Ou seja, quer se prevenir e criar uma cunha entre os professores e funcionários e a comunidade escolar, dificultando qualquer movimento grevista, que só poderá ser vitorioso na defesa da educação pública se estiver unificado”[i].
         O principal objetivo do ESP era criar uma cunha entre os educadores e a comunidade escolar, transformando os primeiros em vilões, em inimigos, em “inescrupulosos doutrinadores” que usam alunos como mera “massa de manobra” (ou seja, queriam transformar os educadores naquilo que a mídia comercial e os partidos de direita são sem nenhum remorso). Evidentemente que mesmo “engavetado”, muitos vereadores e deputados da direita neofascista tentaram e continuam tentando aprovar o PL em câmaras de vereadores, Assembleias Legislativas e até mesmo no Congresso Nacional, mas até o momento não conseguiram, dada a sua flagrante inconstitucionalidade.
         De qualquer forma, o ESP abriu a avenida ideológica (sua verdadeira intenção), pela qual segue agora o projeto das escolas “cívico-militares”. E o governo Bolsonaro não quer militarizar apenas a educação pública. No dia 1º de outubro deste ano recebeu um grupo de mineradores de Serra Pelada que pede intervenção federal no garimpo por meio de uma “administração militar”; e prontamente prometeu enviar as Forças Armadas se tiver amparo na legislação. Ou seja, pretende garantir um projeto que libera mineração em terras indígenas, legalizando garimpos nestas regiões, levando, de quebra, à naturalização do desmatamento e à exploração irrestrita da floresta amazônica.
         Assim governará Bolsonaro pelos próximos anos: militarizando todos os setores da sociedade para melhor atender aos amos imperialistas do norte. Buscando a legitimação de tais práticas, lançará, periodicamente, fake news, falsos raciocínios baseados em dicotomias e intervenções militares para repressão popular da pobreza, que encontrarão receptividade na grande mídia comercial e em muitas mentes imediatistas.

A militarização é a destruição pedagógica da escola pública: como o governo e a grande mídia jogam com o nível de consciência da comunidade escolar?[ii]
         Tal como quando foi lançado o Projeto de Lei do ESP, o Jornal do Almoço da RBS-Rede Globo não perdeu um único minuto e já saiu divulgando o novo projeto de “escolas cívico-militares” para preparar a mentalidade da opinião pública (em especial, da comunidade escolar). Ainda mais num momento em que existe possibilidade da deflagração de um movimento grevista contra a retirada de direitos.
         Numa cobertura jornalística, como sempre, totalmente tendenciosa, o jornal da RBS trouxe um professor, um aluno e um pai que eram favoráveis às “escolas cívico-militares” (sem nenhum contrário). Querem dar suporte ideológico à concretização desse projeto a partir do nível de consciência das comunidades escolares, forjando um apoio, sem contraponto, no nível médio desta opinião pública (que, como sabemos, apoiou a eleição do atual governo federal).
         Segundo o ministro da educação, Abraham Weintraub, a adesão seria voluntária, embora Bolsonaro tenha defendido a imposição de tais modelos. O sentimento que sustenta a criação das escolas cívico-militares parte da compreensão de que a educação pública é hoje desorganizada e não há qualidade no ensino e aprendizagem. A falta de qualidade seria o resultado desta “desorganização”, desconsiderando-se questões materiais, infraestruturais e salariais. É sabido que uma grande parcela de pais é favorável ao “regime militar” por compreender, erroneamente, que o problema da escola pública é unicamente de desorganização e “baderna” – portanto, de falta de controle. E é partindo dessa compreensão rasa de educação que a grande mídia e o governo têm vendido o projeto das escolas “cívico-militares”.
         A dicotomia entre desorganização versus organização é um engodo, pois sustenta que há apenas dois tipos de escola: a atual, desorganizada, com educadores grevistas, com fraco tipo de ensino; e a organizada, que é necessariamente gerida por uma disciplina militar. Não existe apenas essa divisão dicotômica e pobre. A “organização” imposta por militares não resolverá o problema. Quem assim vê a situação pensa que toda a questão da educação se resuma à “disciplina”, o que está muito longe da verdade.
         Ela necessita, antes de tudo, desenvolver todas as potencialidades humanas dos alunos; dentre as quais estão as científicas, filosóficas e artísticas. Para isso, a qualidade mais importante é o pensamento crítico, que jamais poderá surgir em um ambiente de imposições e submissões originadas da disciplina militar. Qualquer grande cientista, pensador ou artista da história só pôde surgir questionando paradigmas impostos. Caso contrário, trata-se apenas de reprodução do que já foi feito. Este tipo de “educação” já nasce condenado e jamais poderá atingir qualquer objetivo importante de desenvolvimento do país e de suas potencialidades humanas. Ao contrário: tende a gerar apenas mão de obra barata, submissa e “disciplinada” (este é o verdadeiro objetivo do governo Bolsonaro) para aceitar a carteira de trabalho “verde e amarela”.
         Pedagogicamente, uma escola cívico-militar só pode impor disciplina de cima pra baixo, assassinando o livre-pensar e o caráter dos alunos. Se, de fato, tal tipo de escola tivesse produzido algum desenvolvimento no campo educacional, então a ditadura militar (1964-1985) teria criado um novo paradigma de educação no país, o que não foi o caso. Cantar o hino nacional jamais suprirá a necessidade de aprender a pensar corretamente. Tal prática apenas gerará indivíduos ufanistas e chauvinistas, sem preocupação com o outro; aprendendo a colocar o “eu” acima do “nós”; a submissão pela submissão; a ordem pela ordem social atual (de exploração e miséria para a maioria). A educação pública necessita tanto da possibilidade do erro, da divergência e da autonomia; quanto nós necessitamos de oxigênio.
         Pelo medo de se chocar com os setores populares da comunidade e, por isso mesmo, pelo temor de se tornar impopular, o CPERS e suas correntes fazem um debate medroso e pela metade. Não responsabilizam todos os atores sociais de acordo com as suas responsabilidades. Assim, com esta atuação, deixam o caminho livre para que as ervas daninhas do neofascismo se proliferem e finquem raízes.

A chantagem da liberação das verbas: o país e o RS não viviam uma crise financeira?
         Contrariamente ao que propaga aos quatro cantos, há dinheiro para a educação... quando interessa! Neste caso, o governo Bolsonaro disponibiliza R$1 milhão por ano para cada escola que aderir “voluntariamente” ao projeto. Neste caso, o voluntarismo é uma hipocrisia, dada as condições de miserabilidade da maioria das escolas públicas.
         Pra piorar, o governo não segue os próprios critérios que prega. Conforme o governo federal e a SEDUC-RS, dois critérios seriam utilizados na definição das escolas: vulnerabilidade social e baixo desempenho no IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Como bem demonstrou um artigo do CPERS[iii], o governo aceitou a adesão de uma escola de Caxias do Sul que possui um índice acima da média. Neste caso, o governo possivelmente usará a escola como modelo e exemplo dos “benefícios das escolas cívico-militares”. Servirá, portanto, para maquiar resultados e não para resolver os graves problemas da escola pública.

Por um programa democrático para organizar a escola pública de acordo com os interesses dos trabalhadores e não dos patrões
         Um dos principais fatores da desorganização da escola pública não é questionado pela mídia (Jornal do Almoço), os governos (em especial o de Bolsonaro) e muitos pais e alunos que apoiam a proposta: o parcelamento salarial e a falta de infraestrutura. Com salários atrasados e defasados; bem como a falta de inúmeros professores e funcionários para completar o quadro funcional, é muito difícil colocar ordem ao caos gerado conscientemente por sucessivos governos, que possuem exatamente este “projeto de educação”. Não é o suposto “excesso de democracia” que gera a desordem e a baixa qualidade; mas justamente o contrário: a falta de democracia nas decisões vindas da SEDUC, do MEC e dos governos, somados à falta de condições materiais, como salários, materiais, funcionários, etc. Há também o problema da concepção pedagógica de muitos educadores, que entravam o processo educativo.
         Impor militares na escola não resolverá nenhum desses problemas; apenas esconderá a baixa qualidade do ensino, a falta de condições e os projetos neoliberais, através do medo do porrete militar. Sadismos, ódios e taras podem ser contentados assim; jamais a qualidade da educação. Além disso, as escolas não tem autonomia sobre a expulsão e a suspensão de alunos, o que cria uma dificuldade extra para a questão disciplinar do ambiente escolar. As escolas cívico-militares poderão suspender e expulsar alunos ou também serão estritamente controladas pela SEDUC? A cada medida punitiva grave será o aluno restituído ao ambiente escolar por ações vindas de fora, sem nem se inteirar do acontecido?
         Sabemos que existem problemas pedagógicos e administrativos por parte dos educadores que necessitam ser debatidos, mas isso deverá se dar no âmbito da comunidade escolar, com a participação real de pais e alunos nos conselhos escolares e assembleias da comunidade, além de um projeto de governo que seja progressivo (diferentemente dos atuais, que são meramente privatistas); e não com imposição militar. Se enganam aqueles que acham que a disciplina por si só é capaz de fazer “milagres”. A ordem que interessa aos trabalhadores e aos seus filhos só pode surgir de discussões democráticas, onde todos tenham possibilidade de debater e votar os encaminhamentos para cumpri-los honesta e coletivamente. A disciplina nascida da compreensão e da assimilação é muito mais eficaz e verdadeira do que a imposta pelo uniforme militar.
         Não temos dúvidas de que a escola pública tem muito para melhorar. Existem posturas profissionais que certamente necessitam ser debatidas a fundo. Mas é errado supor que existe uma saída única para o problema da baixa qualidade da educação pública: no caso, a “saída” da militarização. Isso não significa menosprezar a disciplina: mas esta precisa nascer de dentro; ser compreendida e livremente contratada. Obedecer cegamente nunca resolveu nenhum problema do Brasil, que é um país marcado por sucessivos regimes militares. Se “saídas” deste gênero resolvessem os problemas da educação pública nacional, teríamos centenas de cientistas, filósofos e pensadores; e não de jogadores de futebol e de indivíduos ávidos por abandonar o país.
         Segundo Paulo Freire, ensinar exige saber escutar e disponibilidade ao diálogo. Ou seja, tudo o que uma administração militar se recusa. Além disso, ele sustenta que o verdadeiro ensino não é uma simples transferência de conhecimento do professor para o aluno. É, portanto, uma troca. Para Freire, é necessário que “o educando vá assumindo o papel de sujeito da produção de sua inteligência do mundo e não apenas o de recebedor da que lhe seja transferida pelo professor. (...) O professor autoritário que recusa escutar os alunos, se fecha a esta aventura criadora. Nega a si mesmo a participação neste momento de boniteza singular: o da afirmação do educando como sujeito de conhecimento”. E conclui: “A autonomia vai se constituindo na experiência de várias, inúmeras decisões, que vão sendo tomadas (...) Ninguém é sujeito da autonomia de ninguém”[iv]. Esta pedagogia é profundamente necessária para um país como o Brasil; e uma escola cívico militar significa o aborto desta pedagogia, uma vez que os militares são os sujeitos da autonomia de todos.
         Podemos concluir que as escolas cívico-militares propostas pelo governo Bolsonaro tem as seguintes finalidades: impor obediência (o que assassina o livre-pensar); obrigar a aceitação das condições impostas pelo mercado de trabalho; reproduzir conteúdos (não pensar a partir do novo; ausência de criação); impedir qualquer resistência vinda do chão da escola aos projetos que cortam verbas e, consequentemente, destroem a escola pública. A educação brasileira, carente em todos os sentidos, precisa de um projeto radicalmente oposto a tudo isso. É por isso que o projeto das escolas “cívico-militares” só pode interessar aos patrões e não aos trabalhadores.

Para combater a militarização neofascista das escolas, propomos:
- Que o CPERS e todos os educadores do Estado do RS debatam com as comunidades escolares o que significa pedagogicamente as escolas cívico-militares (isto é, a sua destruição). Este texto serve como um dos subsídios.
- Contrapor o que dizem os grandes pedagogos e pensadores da educação sobre a militarização das escolas públicas com o projeto de escolas cívico-militares.
- Organizar a luta de resistência nas escolas em que o projeto for imposto e a comunidade não aceitar. Denunciar as consequências nefastas do dia-a-dia que inevitavelmente virão em caso de aceitação passiva.
- Transformar a bandeira contra as escolas “cívico-militares” numa bandeira de discussão da nossa “greve” que se avizinha com a população gaúcha, demonstrando que não existe apenas “desorganização (atual)” versus “organização/militarização”.
- Debater o que é patriotismo, a sua relação com os demais países; como se deu a colonização do Brasil, o tipo de “patriotismo” da elite brasileira e por que temos que lutar pela união dos trabalhadores de todos os países, independentemente de qualquer fronteira.
- Esclarecer que educação exige livre-pensar e não cantar o hino nacional, formar filas e reproduzir a moral patriarcal da sociedade.



NOTAS


[ii] Grande parte das conclusões desse tópico surgiu numa reunião do Clube de Filosofia da Escola Estadual Alcides Cunha. Iniciativas como este clube de filosofia certamente não seriam toleradas em uma futura escola “cívico-militar”.
[iv] FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia – saberes necessários à prática educativa. Paz e Terra, São Paulo, 2010.

6 de out. de 2019

QUE TIPO DE GREVE É POSSÍVEL CONSTRUIR COM A ATUAL DIREÇÃO DO CPERS?

Balanço da assembleia geral do dia 27 de setembro

"Uma organização que perdeu a capacidade 
de aprender com sua própria derrota
está irremediavelmente condenada"
(L.Trotsky - Aonde Vai a França?)

A última assembleia geral do CPERS, realizada na casa do gaúcho, apontou um calendário de luta que fala em "construção de greve, recomposição salarial e num ato estadual no dia 15 de outubro". Reunindo a mesma média das últimas assembleias e fazendo um debate muito aquém do que era necessário, a direção central do CPERS dirigiu o evento dentro dos mesmos métodos viciados, o que dificulta a verdadeira mobilização e a aproximação com a base. Como não poderia deixar de ser, lá foi votado novamente uma malfadada "pressão aos Senadores do Estado do RS para votarem contra a PEC 06/2019", dando uma pequena mostra da marca registrada da verdadeira e única política da direção central do nosso sindicato.

Consideramos positivo a não deflagração de uma greve, uma vez que não existem condições no momento. Porém, o debate que é feito tanto pela direção, como pela "oposição", nos causa preocupação pelo nível teórico. A direção central afirma que não existem condições e que "precisamos construí-las". Isso é correto, embora saibamos que ela não moverá uma palha para construí-la no sentido que interessa aos trabalhadores. Para a direção central construir a greve significa jogar o jogo parlamentar e do legalismo burguês, sem fazer nenhuma mudança no atual sindicalismo praticado até aqui, que contribuiu decisivamente para chegarmos no brete em que nos encontramos. A orientação política, sindical, de formação, de relação com os núcleos e com a base está pautada pelos interesses da burocracia sindical de manutenção do aparato, apoio político e eleitoral ao reformismo e de diplomacia secreta. Foi alimentado a ideia de que ganhar tempo seria importante para nós. Isso poderia ser justo se tivéssemos palavras de ordem corretas, combinadas com um trabalho de base coerente.

Não foi o caso...

Existe equilíbrio e uma hierarquia justa entre as palavras de ordem debatidas na assembleia geral? A reposição salarial e a defesa do plano de carreira tem mais poder de mobilização que a luta contra as enturmações ou a demissão dos contratados? Todas elas são justas, mas porque umas se sobrepõe à outras? Aliás, quem decide estas palavras de ordem além da direção central e do Conselho Geral? Há uma construção democrática destas pautas que deitam raízes na base? Qual é a bandeira para os contratados? Apresentamos as nossas palavras de ordem à assembleia geral por considerá-las as norteadoras para o momento que vivemos: defesa dos contratados e a luta contra as enturmações (isto é: emprego e condições de trabalho) para encorajar o precariado da nossa categoria e as nossas comunidades escolares. A reposição salarial vem como reflexo do aumento e da adesão ao movimento e à luta. A questão salarial como pauta principal neste momento é facilmente atacada pela grande mídia visando nos jogar contra a comunidade. Em tempo: a direção central se preocupa com tudo isso? 

Como unificar uma luta contra o governo Leite em defesa do plano de carreira, onde 40% da categoria não está incluída nesse plano? Só esta pauta é uma incoerência, não agrega, não mobiliza e está fadada ao fracasso. Não é casual que o governador Eduardo Leite tenha tentado jogar contratados contra nomeados dizendo que o plano de carreira "se restringe somente aos professores concursados e efetivos que estão na ativa". Sem uma política classista e clara para os contratados, caímos nas armadilhas lançadas pelo governo. Para que os contratados possam defendê-lo, precisam ter a perspectiva de acesso a ele. Por isso a bandeira da efetivação ganha relevância.
***
Em contrapartida, setores da "oposição" sempre defendem greve, que teria um poder miraculoso de resolver as contradições da categoria, da sua consciência atrasada, da falta de condições objetivas, da confusão das reivindicações. A consciência da própria força é um dos elementos mais importantes da força real. Para esses setores "sempre é o momento", independentemente de qualquer fator. Falam contra a direção central, mas não são coerentes com as críticas que fazem. Não questionam que uma greve agora seria conduzida por esta mesma direção que criticam tão duramente; sequer se preocupam com o comando de greve, o fundo de greve, dentre de uma série de outras condições indispensáveis, como a política para os contratados, para o desconto e a recuperação dos dias parados, etc. Facilmente são refutados pela direção central, que sendo a mestra das incoerências e dos sofismas, frente a estes discursos, se vende como a campeã da coerência. Assim sendo, lhe presta um inestimável serviço!

Outros setores de "oposição", um pouco menos numeroso, compreendem que "a categoria está cansada, desgastada, preocupada com o final do ano e que ninguém aderiria a uma greve 'neste momento'". Sabemos da situação da categoria, que é de miserabilidade e de desconfiança com o sindicato. Porém, não podemos destacar prioritariamente isso, uma vez que, assim, acabaremos capitulando para aquela consciência atrasada da categoria que se preocupa unicamente com o calendário, virando o rosto para as dificuldades inevitáveis de um movimento grevista e para o fato de que não temos hora definida para fazer greve. Chegam ao cúmulo da solução mágica quando propõe, tal como as ilusões do réveillon, simplesmente adiar a deflagração da greve para o início de 2020. Este estado de espírito infantil, de dependência da base, não pode nos levar a lugar algum. Temos que nos enfrentar com ele, mais cedo, mais tarde, ou então renunciar a qualquer movimento; dizer categoricamente que não há saída fácil; que pode fazer parte da luta o comprometimento das nossas férias e, inclusive, o nosso "sossego". A preocupação com as férias acima do ímpeto grevista é um termômetro negativo para deflagrar greve.
***
Nós entendemos perfeitamente a necessidade de uma greve. Temos todos os motivos do mundo para fazer uma por tempo indeterminado. Porém, a nossa preocupação é precisamente com as condições objetivas e a burocracia sindical. Esta leva à confusão de bandeiras, a diplomacia secreta, a falta de transparência com a base e a um comando de greve fechado, que tergiversa e enrola sobre o fundo de greve. Em suma: para construirmos uma greve maciça, como apregoa a direção central e seus satélites, precisamos tentar mudar radicalmente o sindicalismo praticado até aqui. Isso pressupõe uma relação totalmente nova com a base. Antes de qualquer coisa, nos leva ao questionamento da burocracia sindical e a alertar, prioritariamente, a base em relação a este problema.

O estado de espírito da categoria, da forma como está atualmente, é facilmente manipulável e ludibriável por qualquer discurso. Pensa em greve apenas numa condição passiva, em que basta ser deflagrada e "fechar a escola" para se resolver por si mesma através de uma "boa condução". Não percebe a necessidade de construí-la, os piquetes, o debate com a comunidade, a luta ideológica contra a grande mídia e o governo; em síntese, a importância fundamental de se apropriar das instâncias sindicais e dos seus espaços, como o comando de greve, por exemplo. É precisamente esta consciência que precisa ser superada e transformada em ação consciente. A burocracia sindical jamais será derrotada pelo espontaneísmo passivo, mas somente por uma ação consciente e organizada. Uma ação desse nível, mesmo parcialmente desencadeada, seria determinante para uma greve vitoriosa; uma greve sem condições neste momento resultaria em nova derrota e apenas fortaleceria a burocracia sindical, aprofundando o nosso brete. 

Qualquer ação descolada dessa construção prévia redundará em atos isolados da categoria; portanto, em ações de vanguarda. A burguesia só concede uma reivindicação importante quando se vê na iminência de perder tudo; isto é, quando sente que o movimento é pra valer, vindo com força da maioria dos trabalhadores. A reposição salarial tão desejada por muitos setores da categoria só pode ser arrancada mediante uma luta muito maior, que vença as noções corporativas e limitadas. A atual direção central do CPERS é imprestável para construir este movimento. Toda a experiência com ela o comprova. A ação eleitoral de pressão parlamentar jamais poderá criar qualquer movimento nesse sentido. É por isso que todas as "negociações" com o governo Leite não redundam em nada! O atual sindicalismo praticado pela direção central é um aliado indireto do governo Leite.

Não podemos confundir os nossos desejos com a realidade! Existe todo um trabalho de base revolucionário a ser feito. Já demos inúmeras sugestões. Estamos abertos a debatê-las e melhorá-las, uma a uma. Sabemos que a direção central não construirá greve alguma no sentido debatido acima. Se, por ventura, for obrigada a deflagrar uma, estará dentro dos moldes que já conhecemos e, portanto, fadadas à derrota. A vanguarda independente tem a palavra. Estamos correndo contra o tempo...

Para unificar toda a categoria pra lutar contra os ataques do governo Leite, a pauta de reivindicações deve incluir todos os trabalhadores, contratados e efetivos. Nesse sentido, a pauta deve ser:
- Contra a enturmação! Organizar as comunidades escolares que estão se mobilizando isoladamente em um único movimento!
- Defesa do plano de carreira! Explicar para a sociedade que se tratam de direitos adquiridos com muita luta e que nada tem a ver com "privilégios" (privilégios existem apenas para os bancos, grandes empresas, justiça, políticos e governos). Desmentir as intrigas do governo Leite e do PSDB para dividir a nossa categoria.
- Pela efetivação dos atuais trabalhadores contratados! Única forma de dar a real unidade para a luta e, ao mesmo tempo, derrotar as intrigas do governo Leite.
- Pela defesa da garantia do trabalho! Contra as  demissões dos trabalhadores contratados!
- Contra as escolas cívico-militares: denunciar que se trata da destruição pedagógica da escola pública!
- Que as assembleias regionais que debatam greve sejam construídas com o mesmo empenho que as que elegem delegados aos congressos!
- Que façamos um debate democrático sobre a hierarquia e o equilíbrio das reivindicações!
- Por um comando de greve eleito e controlado pela base!
- Por um fundo de greve à disposição de um comando de greve eleito pela base!
- Organizar os educadores por escola, junto à comunidade! Abrir a imprensa sindical para as posições divergentes!
- Estudar como formação sindical todos os nossos movimentos grevistas passados! Que todas as correntes de opinião possam se expressar livremente neste debate e dentro do sindicato: pelo fim da ditadura do microfone!