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28 de dez. de 2020

QUE DIFERENÇAS HÁ ENTRE AS "OPOSIÇÕES" DO CPERS?

As eleições do CPERS se aproximam, embora nenhum debate profundo esteja sendo feito (apenas mais do mesmo!). Sequer sabemos das datas, mas já sabemos que serão virtuais (a expressão maior de um sindicato encastelado em si mesmo). As correntes da direção central (DC) do CPERS (PT, PCdoB, PDT e PP) racharam sem que saibamos os verdadeiros motivos, numa total ausência de transparência das reais "divergências". Esta tem sido, infelizmente, a história corriqueira do CPERS. Ninguém aprende nada com as experiências e seguimos lutando de olhos vendados. O que podemos intuir é que parte deste racha tem a ver com o inevitável desgaste de duas gestões inócuas, autoritariamente verticais, onde inúmeros direitos foram perdidos, malgrado que as suas correntes ainda sejam a encarnação dos atrasos e preconceitos políticos, sendo mais preocupante evidenciarmos isso na base da nossa categoria.

Por outro lado, vemos a velha "oposição" — que já dirigiu o sindicato por várias gestões — se ouriçar e aparecer como renovação (mas que renovação exatamente?). Pra piorar, tal "oposição" se divide mesmo mantendo, no essencial, a mesma política e programa, iniciando uma triste disputa nas redes sociais. De um lado MLS, DL, CEDS, CAT, CARA e pequenos setores do Psol; do outro, a maior parte do Psol (CS, Fortalecer o Psol/Intersindical, MES e parte das correntes do PT/CUT que racharam com a DC). Aqui cabe perguntar: o que justifica uma divisão entre essas correntes, companheiros e companheiras?

Comparem e reparem os textos, as declarações, a política e o programa: no essencial não há diferença! "Fora Leite", "Fora Bolsonaro" eleitoral e sem correlação de forças; "greves gerais" por tempo determinado, numa unidade indireta até mesmo com a DC; um vago programa "contra a retirada de direitos" e de "democracia sindical"; tampouco há diferença em relação à "legalidade" do funcionamento sindical do CPERS (isto é: um sindicalismo de imposição de maiorias sobre minorias, ainda que umas sejam mais sutis do que outras, onde impera o "diálogo de surdos").

Bom, então a diferença se dá entre as centrais sindicais e os partidos? No essencial, a política dos partidos e centrais sindicais é a mesma (tanto é que assinam centenas de manifestos nacionais conjuntos com a mesma política, o que inclui o "Fora Leite", o "Fora Bolsonaro" e a "greve geral"). Quando se trata da participação na CNTE (braço educacional da CUT) a unanimidade é plena (até mesmo com a DC). E em relação ao trabalho de base e a política de formação, há diferenças? Não! E sobre a renovação e abertura para a base administrar e conduzir junto o sindicato, desde a DC até os núcleos de base? Também não! E sobre a abertura da imprensa sindical e dos meios de comunicação (incluindo as inserções midiáticas)? Outra vez não!

Então há diferenças em relação à política para a questão da precarização do trabalho e dos contratos "emergenciais"? Também não há diferença no essencial (com algumas honrosas exceções individuais na "oposição", pois uma política não se expressa apenas por "boas intenções", mas ela deve ser levada para o combate na base, ser defendida com precisão frente a distorções e deturpações que fazem a seu respeito). Por um lado, temos uma política evidentemente patronal das correntes da DC (que demonstra algumas boas intenções de mudanças — embora seja apenas isso: intenções!) e de correntes da "oposição" (como o CEDS e o MES/Psol); por outro, temos uma política vacilante que se omite muitas vezes sobre a defesa das contratadas e dos contratados (o que dirá falar publicamente sobre a efetivação?). Muitas dessas correntes de "oposição" falam em efetivação "no varejo" e calam sobre isso "no atacado". Sendo assim, a política para as(os) trabalhadoras(es) contratadas(os) não é um empecilho para tal "unidade", tanto é assim que correntes radicalmente contra a efetivação estão juntas com as que a defendem vacilantemente.

"Em terra de egos quem enxerga o outro é rei!"
Sem diferenças essenciais, que não são debatidas e levadas ao conhecimento da base, nada justifica que a "oposição" não esteja na mesma chapa. A não ser, que o problema seja o controle do aparato sindical e a saciedade da fome de determinados egos dirigentes. Tal tipo de condução política e sindical elege um único inimigo e se vende como 100% pura e correta. Não admite nenhum defeito, nenhuma derrota, nenhum problema, e não realiza nenhuma autocrítica ou busca uma “autocura”. Isso leva apenas a querer “mudar o mundo” ou o "sindicato" com ódio, sem amor e sem reconhecer os próprios demônios, evitando traçar seus limites. Isso não pode construir um sindicato e um mundo novo, mas apenas perpetuar o velho e aprofundar suas mazelas.

Formação política e sindical não deve tratar apenas de cursos abstratos, mas debater erros e acertos das correntes e da condução do CPERS; esclarecer a base sobre o cerne das divergências e não guardá-las a sete chaves. Parte importante da burocracia sindical vive nessa condução secreta do sindicato que jamais chega à base. Nós somos avessos a este tipo de condução política, que é comum à situação e "oposição". Nossas divergências com a atual DC e as "oposições" estão registradas em quase 10 anos de postagens deste blog que vos fala. Elas não são conjunturais ou eleitoreiras: são amplamente conhecidas de qualquer militante que tiver boa vontade. Apesar disso, estamos sempre abertos ao diálogo e ao bom debate, que pode ser duro, mas é sempre honesto e formativo.

E você, cara leitora ou caro leitor, reconhece alguma diferença essencial entre as correntes de "oposição"?

17 de dez. de 2020

TESE DO COMITÊ ESTADUAL DAS EDUCADORAS CONTRATADAS

Publicamos abaixo, na íntegra, a tese do Comitê Estadual das Educadoras Contratadas, apresentada ao X Congresso do CPERS, realizado em setembro de 2019 em Bento Gonçalves (RS). No caderno de teses deste congresso aparece com o número 4 (página 35). Por ter acordo com o seu conteúdo, a publicamos com a esperança de que seja um importante subsídio teórico para embasar a prática da luta dos contratados e contratadas da nossa categoria.


A situação dos contratados “emergencialmente” de nossa categoria está relacionada com um processo político e econômico muito mais profundo do que a “mera vontade” desses educadores de assinar um contrato precário. Trata-se, antes de tudo, das consequências da reestruturação produtiva do capitalismo, iniciada em fins dos anos 1980 e início dos anos 1990.

        Esta reestruturação produtiva está intimamente ligada à restauração do capitalismo nos países ditos “socialistas”, como a União Soviética (URSS), o leste europeu, Cuba, China, etc., e a subsequente ofensiva da burguesia contra os direitos dos trabalhadores no mundo todo, sobretudo contra o chamado Estado de bem estar social.

        A URSS, com todos os seus problemas, representava um contrapeso e um freio às ambições dos países imperialistas (EUA, Inglaterra, França, Alemanha e Japão), que precisavam fingir-se preocupados com os direitos dos trabalhadores para que estes não voltassem seus olhos para o socialismo. Uma vez que esta “ameaça” não mais existe, o imperialismo viu-se então com as mãos livres para iniciar uma cruzada contra os direitos elementares dos trabalhadores no que ficou conhecido como reestruturação produtiva.

        A partir daí a maioria das categorias profissionais no mundo todo sofreram brutais ataques: desde o operariado e os setores de serviços até o funcionalismo público (que era o alvo principal dos ataques ao Estado de bem estar social). A precarização do trabalho foi se aprofundando ano após ano, com desregulamentação do mercado de trabalho, contratos precarizados em todos os setores e retirada sutil de inúmeros direitos. No setor metalúrgico, por exemplo, se introduziram novas formas de contratação que impediam acesso a direitos elementares, tendo reflexos nefastos sobre os salários: “enquanto a remuneração média de um empregado efetivo da GM é de R$1.935, a remuneração de um temporário é de R$1.200”[i]. Em meados de 2003, quase a metade dos 16 mil trabalhadores da GM estava sob regime de contratação instável. A ampliação desse regime de trabalho atingiu também os setores produtivos, de manutenção e montagem e, ainda, a construção civil[ii].

A “flexibilização”, ou o que é mais correto, a retirada de direitos que foi impulsionada pelo mercado correspondeu ao aumento desenfreado da contratação emergencial no magistério público estadual e no serviço público em geral. No início dos anos 1990, a contratação “emergencial” era restrita e controlada, sendo suprida pela realização regular de concursos públicos que absorviam os educadores contratados (com raríssimas exceções). Com o passar dos anos e o aprofundamento deste processo de reestruturação produtiva, a contratação “emergencial” foi se tornando o regime preferencial de admissão funcional, uma vez que, além de ser muito mais barata, impedia o acesso ao plano de carreira e aos direitos básicos dos servidores nomeados. A partir dos anos 2000, os governos estaduais passaram a ser pressionados cada vez mais por esta lógica econômica do mercado, tornando os concursos cada vez mais raros, e, quando realizados, não nomeavam a totalidade dos aprovados, como supostamente manda a lei.

Com a crise capitalista iniciada por volta de 2008, a reestruturação produtiva atingiu o seu auge e transformou-se nos famigerados “Planos de austeridade”, de “Ajuste Fiscal”, na “Reforma Trabalhista” e no processo de “terceirização”, com consequências ainda mais nefastas sobre os setores precarizados. Os concursos públicos foram congelados e ameaçados; a contratação “emergencial” tende não apenas a se manter, como a se deteriorar, transformando-se naquilo que é a especialidade dos governos do PSDB: contratar no início do ano e demitir em dezembro, tal como acontece com a Categoria “O” de São Paulo.

 

A contratação “emergencial” a nível nacional

Adotar a contratação “emergencial” como forma preferencial de admissão atendia a dois objetivos centrais: 1) reduzir os custos com a mão-de-obra, concretizando os objetivos da reestruturação produtiva do capitalismo no funcionalismo público; e 2) dividir a resistência sindical da nossa categoria (conhecida pelas longas greves), jogando nomeados contra contratados e dificultando a luta de resistência para os últimos, que ficam mais vulneráveis ao autoritarismo dos governos e da SEDUC, tal como atestam as demissões de ativistas sindicais contratados em algumas greves e a ameaça de demissão dos contratados pelo governo Sartori durante a greve de 2017.

Todo este processo descrito aqui não é precisamente uma novidade para as direções sindicais e as correntes majoritárias do CPERS. Algumas sabem perfeitamente que “em 7 estados, mais da metade dos contratos de professores são temporários”[iii], como no Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Acre, Ceará, Santa Catarina e Paraíba. Em seis, somam cerca de 40%. Em 2013 se estabeleceu uma média nacional de que “três em cada dez servidores nas redes estaduais são temporários”[iv]. E desde lá essa média não para de subir.

Em São Paulo há cerca de 4 regimes de admissão no magistério estadual, sendo o mais nefasto o da Categoria “O”, que possui prazo determinado. Em Santa Catarina ocorre um “concurso público” para os contratados todo o início de ano, que se encerram compulsoriamente em dezembro. A reestruturação produtiva do capitalismo tende à “uberização” de todo o mercado de trabalho, inclusive na educação pública. A gravidade dessa situação não é captada em toda a sua profundidade pelas direções do CPERS e pela maior parte da nossa categoria, que normalmente apresentam uma política burguesa em relação aos contratos emergenciais.

Em 2016 foi aprovada a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55, a famigerada “PEC do fim do mundo”, que congela gastos públicos por 20 anos. Vinculadas à PEC 55 surgiram outras PECs e LDOs que vieram na esteira do “Ajuste Fiscal” e do golpe de 2016, “legalizando” o congelamento de concursos e nomeações. Ou seja, apenas oficializam uma situação que já era quase a prática. Enquanto o inimigo avança a reveria de qualquer legislação, a burocracia sindical do CPERS reza fielmente a cartilha jurídica contra quase a metade de sua própria categoria.

 

A contratação “emergencial” no RS

        No Rio Grande do Sul há uma política consciente de “dividir para reinar”, aplicada por todos os últimos governos, que usam e abusam desta autoridade da lei contra os contratados, enquanto eles próprios desrespeitam diversas leis. A legislação e as sentenças judiciais que proíbem parcelamento e atraso salarial, por exemplo, bem como a que institui o pagamento do Piso Nacional e a que o obriga a aplicação de 35% da arrecadação na educação pública é solenemente ignorada (dentre várias outras leis). Enquanto isso, “os deveres” dos contratados são exigidos à risca e todo o peso da lei é usado contra eles. Segundo uma atendente da SEDUC-RS os contratados só tem um direito: trabalhar!

        A contratação “emergencial” na nossa categoria, ao atingir dezenas de milhares de trabalhadores por muito tempo, não pode ser revertida integralmente a curto ou médio prazo através de uns poucos concursos públicos (isso o demonstra bem os 2 concursos públicos do governo Tarso, que mais serviram pra jogar nomeados contra contratados do que para “resolver o problema”). O fim da contratação pressuporia que o governo foi forçado a abandonar essa política. Nessas condições, a defesa apenas do concurso público como solução única para o problema é alimentar uma ilusão mágica e, na prática, compactuar com a continuidade da contratação “emergencial”. É isso que faz a direção do CPERS com o discurso monótono de concurso público, que ignora a situação dos contratados, nos mantendo como párias permanentes. Toda esta realidade abre precedentes para violar direitos mínimos. Inúmeros são os relatos do interior do Estado e de Porto Alegre em que se verificam o aproveitamento deste trabalho precário, que degenera em novas agressões psicológicas e físicas, assédio moral, perseguição política e pessoal e, até mesmo, situações que poderiam configurar trabalho análogo à escravidão.

        Muitos aprovados em concursos públicos foram coagidos a aceitar a sua admissão por intermédio de um contrato, fato que é vergonhosamente ignorado pelas direções e principais correntes do CPERS. A burocracia sindical alega que os contratados sabiam da sua condição precária e do seu caráter “emergencial” ao assumir. Essa é a lógica cínica da burguesia. Um trabalhador desempregado, em regra, não está em condições de rejeitar certas condições draconianas que lhe são impostas, ainda mais quando o próprio contrato é omitido a quem o assina (até o início de 2019, ninguém ganhava cópia). Essa situação não impede que futuramente estes trabalhadores possam lutar pela melhoria dessas condições, pela igualdade com os demais trabalhadores e pela sua estabilidade; isto é, direitos mínimos que deveriam ser garantidos a todo trabalhador.

Não existem contratos emergenciais, mas de longo prazo. Por isso, os muitos anos trabalhados na categoria representam um direito moral adquirido, que a burocracia do CPERS não reconhece ao fazer o jogo do governo se calando frente à remoção e à demissão de contratados. Ao contrário disso, nós defendemos que o CPERS levante a bandeira de nenhuma demissão de contratados, pois quem os colocou nessa condição foi o nosso patrão, o governo do Estado, e a lógica do mercado.

 

Aonde leva a política de exigir apenas “concurso público” aplicada pelas últimas direções do CPERS?

        As últimas experiências que tivemos com os concursos públicos serviram para nomear metade dos aprovados, mas, também, para jogar nomeados contra contratados, aumentando a divisão sindical e política da nossa categoria. Em 2012 e 2013, o governo Tarso e a grande mídia procuraram iludir a população e, em especial, a nossa categoria, afirmando que os atuais concursos públicos do magistério “iriam resolver o problema da contratação emergencial”. Vimos exatamente o oposto: os concursos foram usados para dividir a categoria, jogando nomeados contra contratados, assediando moralmente estes últimos com a ameaça de remoção e de desemprego, criando um clima geral de submissão e medo. Vários colegas foram removidos de suas escolas arbitrariamente “segundo a lei” e mais de 3 mil contratados foram demitidos na transição do governo Tarso para o governo Sartori em 2014.

        Qual foi a política do CPERS frente a isso? Novamente a política de Pôncio Pilatos: lavar as mãos! A isonomia é uma palavra fora do seu vocabulário. Canta o seu samba de uma nota só: concurso público já! E o que fazer quando os governos conscientemente jogam uns contra os outros dentro da nossa própria categoria? Nossa resposta deve ser uma formulação política classista que permita, com coerência e consciência do todo, defender os trabalhadores contratados e, ao mesmo tempo, os concursos públicos, além de combater a reestruturação produtiva do capitalismo (o famigerado “Ajuste Fiscal”). A política omissa existente hoje no CPERS em relação aos direitos dos contratados é reacionária, pois defendem o concurso público como única solução para esse problema. Culpam os próprios contratados por sua situação e só lembram-se destes na hora do desconto sindical do contra cheque: a única igualdade e “companheirismo” que reconhecem! Uma vez filiados, estão largados à própria sorte ou tratados como “raça inferior”.

        É por isso que o Comitê Estadual dos educadores contratados conclama a nossa categoria a reforçar a luta pela sua unidade, contra o trabalho precário, apoiando as bandeiras de defesa dos contratados. Essa luta será longa e não terá apenas uma bandeira. Não existe uma única solução como quer a direção central do CPERS. As soluções passam por concursos públicos e também pela integração na categoria, com plenos direitos, dos atuais contratados. É uma luta ao mesmo tempo pela unidade de todos os trabalhadores. Qualquer debate fora desse eixo não está no campo classista, levando água ao moinho do governo e do mercado.

 

A falsa dicotomia entre efetivação versus concurso público

        A nossa categoria luta contra a meritocracia que os governos neoliberais querem impor visando a destruição dos planos de carreiras e a demissão de servidores. É justo lutar contra isso! Mas esta “luta” se perde quando percebemos que existe um certo desprezo pelos contratados.

A legitimação do mundo moderno como “justo” e “igualitário” está fundamentada na meritocracia; ou seja, na crença de que superarmos as barreiras de nascimento das sociedades antigas é possível pelo “esforço individual”. Assim, todos poderiam conquistar uma “vida digna”. A ideologia da meritocracia permite culpar o pobre pelo “próprio fracasso” e fazer com que o rico se sinta bem com a sua própria consciência, ocultando todo o processo de desigualdade e exploração. Seguindo a mesma lógica, pode-se culpar os contratados pela sua própria condição.

A defesa do mercado como regulador absolutista o toma por “justo” porque ele supostamente daria remuneração “justa”, verdadeiramente equivalente ao desempenho. O Estado também prega o mesmo: eu faço concursos públicos abertos para todos, e o melhor deve vencer. Tudo isso não significa desconsiderar a importância dos concursos públicos como forma de admissão, mas sim, que não devemos esquecer seus problemas e suas limitações na hora de pensarmos a luta sindical e política da nossa categoria como um todo.

As direções do CPERS incentivam ocultamente o discurso meritocrático. E transformam este raciocínio raso numa nova forma de pensamento binário: “quem defende a efetivação dos atuais contratados é contra o concurso público”! Os defensores do concurso público seriam os justos, os corretos, os bons; e os defensores da efetivação dos contratados os maus, os diabólicos, os aproveitadores. No mundo não existe apenas o preto e o branco, mas uma infinidade de cores. Defender os direitos e as condições de trabalho de sua própria categoria é um dever de qualquer sindicato, renegado pelo CPERS, que se baseia numa visão meritocrática rasa de grande parte da nossa categoria, que se sente ofendida na sua “legitimação” do concurso público, sem considerar que se trata de uma política consciente de governos neoliberais que precisa ser combatida também conscientemente. Com o enfraquecimento da luta sindical todos perdem.

        Apesar de regimes de trabalhos diferentes e da forma de admissão, nomeados e contratados estão no mesmo barco: os segundos têm os mesmos deveres, mas não os mesmos direitos. Vemos seguidamente o caos nas escolas, com demissões e remoções de educadores, enquanto a direção do CPERS nada faz e naturaliza demissões. Quando elaboramos a bandeira da efetivação dos educadores contratados, por exemplo, foi baseado nesta necessidade de solidariedade de classe visando a unidade sindical da base. Porém, ainda que alguns setores de nossa categoria tenham se oposto a ela por razões rebaixadas, nada classistas, também vemos e sentimos uma resistência inaceitável por parte de correntes sindicais do CPERS, sejam da direção ou da oposição; inclusive correntes que se dizem “socialistas”. Que espécie de “socialismo” podem defender se não são capazes de lutar pela igualdade de condições de trabalho entre uma mesma categoria? Para elas, os mecanismos legalistas do Estado burguês estão acima da luta concreta e da solidariedade de classe. Se o socialismo não está previsto na Constituição, como podem lutar por ele?

 

Por uma política classista para o CPERS combater a precarização do trabalho: pela efetivação dos atuais educadores contratados!

        Frente à política de efetivação, refletindo esta falta de consciência de classe, muitas vozes (sobretudo na direção central) argumentam que “ser a favor da efetivação dos atuais contratados significa a desmoralização do concurso público e do Plano de Carreira”.

Já afirmamos em inúmeros textos e discursos que não se trata de tornar a efetivação a forma preferencial de ingresso no magistério público. Pelo contrário. Defendemos a efetivação e a extensão do Plano de Carreira apenas aos contratados que já estão trabalhando no Estado e que já cumprem os mesmos deveres, mas que não possuem os mesmos direitos. Trata-se, justamente, de ter uma política para desestimular as contratações “emergenciais” futuras (que se tornaram permanentes) e, principalmente, de combater a destruição neoliberal dos serviços públicos. Para os futuros educadores o ingresso deverá se dar prioritariamente por concurso público, sem nenhuma concessão aos contratos “emergenciais”. Isto é a única forma coerente de defender os concursos públicos e os atuais educadores contratados, evitando que o governo utilize os concursos como forma de dividir nossa categoria jogando uns contra os outros. Delineamos uma política para enfrentar esta realidade, ao contrário das correntes burocráticas e legalistas-burguesas do CPERS, que empenham-se em criar “soluções” estéreis que apenas dão margem para os governos massacrarem os contratados.

        Outras correntes sindicais tentam “inovar” quando propõem que “os contratados devem ter direito à CLT” (hoje já praticamente destruída pela Reforma Trabalhista). Esta proposta apenas oficializa a divisão da categoria e acelera o fim dos Planos de Carreiras, pois isto significa a legalização de dois regimes de trabalho para uma mesma categoria: os nomeados, regidos pelo Plano de Carreira, e os contratados, que seriam regidos pela CLT. Isto sim é a “desmoralização do Plano de Carreira” e, também, aquilo que os governantes mais querem, a exemplo do que ocorre em São Paulo, onde impera 4 tipos de vínculos empregatícios.

       Nesse sentido, a defesa dos Planos de Carreiras passa pela luta em defesa da inclusão dos contratados nos planos de carreiras. Um só regime de trabalho para uma só categoria! Insistiremos nesta questão em razão das diversas distorções conscientes feitas sobre a nossa proposta. Aqui cabe um paralelo com a política do CPERS de inclusão dos funcionários de escola no Plano de Carreira (o que temos acordo). Se a direção central apoia a justa extensão do Plano de Carreira aos funcionários, porque se opõem a estendê-lo a todos os atuais contratados?

       A defesa por parte da direção central e demais correntes do CPERS do concurso público como solução única para o problema tem servido, na prática, para compactuar com a continuidade da contratação e excluído a única saída classista para o problema dos contratados (a efetivação). Frente à sangria desatada das contratações “emergenciais” o CPERS e nenhuma de suas correntes nunca propuseram luta alguma (como um ato público em frente à SEDUC, por exemplo) ou sequer as denunciaram no momento em que ocorriam.

        A real defesa do concurso público passa, atualmente, por lutar e denunciar qualquer tentativa da SEDUC em contratar mais educadores “emergencialmente” e, também, por fiscalizar a realização dos concursos públicos: cobrar a divulgação do gabarito, acompanhar a “correção”, questionar irregularidades, etc. Não agindo deste modo, a defesa do concurso público é só uma retórica vazia para se contrapor à nossa palavra de ordem, pois de concreto não fiscaliza e nem atua no sentido de enfrentar as ilegalidades e irregularidades praticadas pelos governos e pela SEDUC.

***

Outros companheiros e colegas do chão de escola afirmam, erroneamente, que “não podemos defender a efetivação dos contratados porque isso vai contra a Constituição”, como se a luta sindical devesse se resumir apenas ao que é aceitável para as leis dos governos e dos patrões, ignorando toda a conjuntura e a nossa realidade cotidiana.

       Este argumento esquece o papel que um sindicato tem de defender os seus trabalhadores levantando bandeiras novas que possam, por ventura, questionar a legislação vigente, inclusive a Constituição. Por acaso os governos cumprem integralmente a Constituição? Eles cumpriram a Constituição quando introduziram a contratação emergencial em massa e por décadas no serviço público? E o que dizer de inúmeros colegas que foram aprovados no concurso de Yeda e Tarso, mas que não foram nomeados? Por que se opõe a efetivação destes também? Não reconhecem a legitimidade destas efetivações apenas porque o concurso foi cancelado? Na prática, reforçam a política ilegal do governo de precarização do trabalho.

       Nenhuma destas correntes entra no mérito da nossa argumentação para se opor à efetivação. Pelo contrário, procuram distorcer o que falamos ou, simplesmente, ignoram a monstruosa realidade descrita até aqui. Cabe relembrar a eles que, a mesma Constituição que usam contra a luta pela efetivação dos contratados, afirma em seu artigo 7: “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXIV – igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso”. A direção central e os setores atrasados de nosso sindicato relembram a Constituição apenas contra os trabalhadores. Nós a relembramos a favor deles. Qual destas duas constituições o CPERS fará valer?

Não compreender toda esta conjuntura, reduzindo-a a uma política oportunista dentro da ordem legal (exigindo apenas concurso público) é não querer mudar esta realidade. Ao contrário: trata-se de uma perigosa adaptação a ela. A maioria das correntes sindicais do CPERS, para fazer proselitismo com os contratados, vacila entre esta política burguesa apresentada pela burocracia sindical e uma política classista pra enfrentar a precarização. Relembramos que na luta de classes não é possível “acender uma vela pra cada santo”. É preciso coerência e firmeza.

O CPERS sabe que é direito de qualquer trabalhador no suposto Estado democrático de direito lutar por qualquer bandeira política que julgue justa. Ninguém pode ser tolhido do direito de reivindicar, já que este direito está previsto na mesma Constituição que supostamente reivindica. Além do mais, a juíza do trabalho presente na Audiência Pública dos Educadores Contratados na Assembleia Legislativa do RS, realizada no dia 11 de dezembro de 2017, reconheceu perante mais de 300 educadores (incluindo a direção central do CPERS), que o vínculo “emergencial” já está descaracterizado, o que abre várias brechas para a efetivação e outras reivindicações de direitos mínimos.

Há muito tempo que a questão dos contratados transcendeu o campo jurídico e se tornou uma questão política. É preciso sair do palavrório jurídico e entrar no campo da denúncia e da agitação política, sem o quê, nenhum direito pode ser conquistado ou ampliado. Assim, pode-se notar claramente que a bandeira única de concurso público e a “explicação” de “violação da Constituição” por parte da direção central do CPERS e das demais correntes sindicais, usada quase como uma fatalidade divina, não passa de uma opção política de deixar os trabalhadores mais precarizados de sua própria categoria desassistidos e desamparados, sem nenhuma bandeira de luta.

Admitir isso não nos torna cegos sobre as dificuldades jurídicas de todo o processo, mas estamos convictos da justeza da posição de efetivação e, enquanto tal, dispostos a lutar por todos os meios e a debater com qualquer ator social que esteja disposto honestamente a concretizá-la. Pensamos um formato para a efetivação que pode e deve ser aperfeiçoado ao longo dos debates e das polêmicas honestas: efetivação para todos os atuais contratados com mais de 3 anos de efetivo exercício (mesmo tempo do estágio probatório). Aos educadores nesta condição, sem terem concluído a graduação, se dá o tempo necessário à conclusão do curso para que ocorra a efetivação.

Mesmo havendo problemas iniciais nesta formulação, estamos abertos a debater e melhorar a forma reivindicatória desta bandeira com todos os ativistas sindicais e sociais bem intencionados e com consciência de classe; estejam eles dentro ou fora do CPERS.

***

        Sabemos também que a efetivação não deve ser a única bandeira de luta dos contratados. Existem tantas outras reivindicações intermediárias que precisam ser levantadas e debatidas seriamente nos seus momentos determinados que prepararão a efetivação. Cabe destacar a luta pela equidade de direitos, pela punição ao assédio moral aos contratados, contra a remoção arbitrária de escolas, contra a demissão de contratados em licença-saúde e, sobretudo, contra os contratos por tempo fechado e a demissão, uma vez que esta representa apenas a utilização descartável da mão-de-obra que acontece, repetimos, não por iniciativa dos educadores contratados, mas dos governos e do mercado, que tem preferência por este tipo de regime de trabalho.

        Defendemos um CPERS que acolha as demandas dos educadores contratados, que negocie remoções e demissões; que trabalhe em cada momento com as palavras de ordem mais condizentes com a conjuntura, mas sempre tendo no horizonte uma perspectiva classista.

***

        Compreendemos que a luta dos educadores contratados dentro do CPERS representa o legítimo descontentamento contra condições precarizadas de trabalho que traduzem a visível decadência do capitalismo. A adesão do CPERS a esta luta representa um passo importantíssimo na readequação do nosso sindicato aos tempos atuais e a luta concreta contra a precarização do trabalho. A era do “trenzinho da alegria” da ditadura militar ficou para trás há muito tempo.

Vivemos o período dos “ajustes fiscais”, da retirada de direitos, da destruição do Estado de bem estar social, da reestruturação produtiva do capitalismo. Quem não entendeu isso não entendeu nada e, portanto, não está apto para opinar sobre esta polêmica acerca da precarização do trabalho na nossa categoria, expresso através da política permanente de contratação “emergencial”. Enquanto os educadores contratados não tiverem bandeiras próprias em sua defesa e reconhecimento, bem como forem destratados por governos e direções sindicais, estaremos fadados à divisão sindical, ao enfraquecimento da luta e submetidos a uma consciência patronal, totalmente alheia aos nossos interesses de classe.

 

Assinam esta tese:

Nome e tempo de contrato “emergencial”:

1. Fábio André Pereira - 9 anos

2. Gilma Soares - 10 anos

3. Ilda Marques de Freitas - 10 anos

4. Lucas Berton - 10 anos

5. Nara Nair Carvalho - 15 anos

6. Luciana Santana - 8 anos

7. Alessandro Santos - 13 anos

8. Naiara Silveira – 8 anos

9. Alamara Unters Rodrigues - contrato fechado (10/04/ 2019 a 20/12/2019)

10. Allysson Arthur Roque dos Santos - 10 anos

11. Alonir Jorge Santanna Junior - 1,5 ano

12. Ana Gonzalez - 11 anos

13. Ana Luiza Guterres Velasquez - 8 anos

14. Ana Maria Rodrigues Velasque - 7 anos

15. Ana Paula Hamermuller da Silva - 10 anos

16. Andréa Lazaro - 11 anos

17. Andréa Navarro - 9 anos

18. Angélica Mattos de Oliveira - 9 anos

19. Carine Muraro Berti - 5 anos

20. Carla Ediane Guedes Vargas Romano - 10 anos

21. Carla Gonçalves - 5 anos

22. Carla Shaiane Soares Quadros - 9 anos

23. Caroline Seixas de Almeida - 8 anos

24. Cibele Opitz - 13 anos

25. Clarice Job Nunes Bastos - 1,5 ano

26. Cláudia Bettio Ludwig Barth - 11 anos

27. Cristina Dewes Chassot - 5 anos

28. Daiana da Silva - 12 anos

29. Debora Barbosa Flores - 7 anos

30. Deborah Feijó da Fonseca - 7 anos, efetiva

31. Deise Caroline de Amorim - 14 anos

32. Deives Jurandir Rocha da Rocha - 12 anos

33. Denise Pizoni Cardoso da Silva - 9 anos

34. Ederson Alex Fernandes Rocha - 15 anos

35. Eduardo Martins da Costa - 10 anos

36. Elenice Moreira Vargas - 10 anos

37. Eliana Pires da Cunha - 10 anos

38. Eliane Carmanim Lima - 1 ano

39. Eliane Teixeira - 8 anos

40. Elsa Cristina Gama Garcia - 15 anos

41. Eva Paula Ribeiro de Carvalho - 8 anos

42. Fernando Dutra Júnior - 4 anos

43. Gislaine Marques Santos - 9 anos

44. Guilherme Santos de Castro - 10 anos

45. Helen Lopes Amaro - 21 anos

46. Inail Barbosa da Silva - 2 anos

47. Janaina Souza Geyer - 9 anos

48. Janice Perez Avena - 8 anos

49. João Paulo Stadikovski dos Santos - contrato fechado (05/06 a 23/12/19)

50. Jonas Cordeiro - 16 anos

51. Josué de Oliveira - 3 anos

52. Júlia Maria Lima da Silva - 10 anos

53. Julio Cesar Pires dos Anjos - 08 anos

54. Karen Cris Sartori Frederico - 10 anos

55. Karine Gomes - 10 anos

56. Karla Ramires - 7,5 anos

57. Kátia Simone Alto de Mattos - 14 anos

58. Katiana Pinto dos Santos - 32 anos, efetiva

59. Katiúsce Rodrigues da Luz - 1 ano

60. Letícia Lara dos Santos - 10 anos

61. Letícia Neumann - 10 anos

62. Lisandra Coromaldi - 18 anos

63. Luciana Nunes - 7 anos

64. Luciani dos Santos Ramires - 6 anos

65. Luís Eduardo Rodrigues – 5 anos

66. Luiz Gustavo Salles - 8 anos

67. Maicon Teixeira Viana – 4 anos

68. Mainara Maciel Rodrigues Carvalho - 3 anos

69. Mara Pereira - 10 anos

70. Marcelo Borges da Silva - 3,5 anos

71. Márcia Denise Salomoni - 9 anos

72. Marcia Quadros - 21 anos

73. Marco André Prates Garcia - 20 anos

74. Maria Berenice Lorenzen Moraes - 19 anos

75. Maria José Oliveira de Andrade - 10 anos

76. Marina Lima Porto - 15 anos

77. Marisa Fernanda da Silva - 15 anos

78. Marta Giani Batista Duarte - 7 anos

79. Meire Deloair Bergara Barreto - 21 anos

80. Michele Machado Pires - 14 anos

81. Neli Scisleski - 14 anos

82. Neli Weber - 10 anos

83. Nely Terezinha Ladeira - 9 anos

84. Paulo Moacir da Silva Jr. - 21 anos

85. Paulo Sérgio Batista - 11 anos

86. Renata B. Borges Fortes - 10 anos

87. Renata Sanna Jorge - 9anos

88. Rosângela La Regina Liesenfeld - 7 anos

89. Roselaine Teixeira dos Santos Paula - 9 anos

90. Roseli Fernandes da Silveira - 21 anos

91. Rosimeri Martins Oliveira Valença - 4 anos

92. Rosemeri Ziero - 13 anos

93. Salete Marlene Garcia dos Santos - 18 anos

94. Sandra Sartori Pereira - 7 anos

95. Saul da Silva Nunes - 8 anos

96. Silvia Acosta Gularte - 5 anos

97. Silvana Pedroso da Rocha - 9 anos

98. Sônia Maria Zanette Dos Santos - 7,5 anos

99. Tatiana Garcia Flores - 2 anos

100. Tatiane Mendes - 10 anos

101. Vanessa Vallados Andriotti - 10 anos

102. Viviane Roduit de Souza - 7,5 anos

Comitê Estadual dos educadores contratados

Grupo de WhatsApp Contratados Pela Efetivação




CITAÇÕES

[i] FRANCA, Gilberto Cunha. O Trabalho no espaço da fábrica, um estudo da General Motors em São José dos Campos (SP). Editora Expressão Popular, São Paulo, 2007.

[ii] Idem.

[iii] Caderno de teses do VIII Congresso Estadual do CPERS, página 113 (com dados de 2013).

[iv] Idem.


29 de nov. de 2020

O GENOCÍDIO DO POVO NEGRO CONSEQUÊNCIA DO RACISMO ESTRUTURAL DO CAPITALISMO


         O racismo estrutural no Brasil é composto de práticas históricas, institucionais e culturais de exclusão social, violência policial ditada pelo Estado que tem como alvo a população negra. O genocídio do povo negro está em curso há 520 anos no Brasil. Essas ações violentas estão alicerçadas na herança escravocrata do Brasil colônia. Entre os séculos XVI e XIX a coroa portuguesa usurpou o continente africano trazendo aproximadamente 5 milhões de negros e negras, na condição de escravizados, sob intensa violação de seus corpos, para servir de mão-de-obra nas grandes fazendas produtoras de cana-de-açúcar e mineração, e assim garantir o desenvolvimento da colônia.

            Nesses três séculos de escravização sob o regime colonial o discurso religioso da cristandade serviu para legitimar e dar suporte ideológico para impor ao povo negro a tortura, estupros e as mais bárbaras violações dos direitos humanos, visando “convertê-los” à fé “cristã”.

            O racismo é inerente ao sistema capitalista, assim como a homofobia, misoginia e todas as formas de opressão e exploração. O lucro é o deus do mercado, e para submeter bilhões de trabalhadores(as) é necessário impor terror e medo, “normalizar” a violência e a exploração, acumular e privatizar a riqueza produzida pelos(as) trabalhadores(as) na mão de uma elite perversa.

 

Por que João Alberto Silveira de Freitas foi assassinado?

           João, um homem negro que não baixava o olhar, encarava os racistas e a exclusão que o povo negro sofre historicamente. João olhava nos olhos de seus algozes, não manifestava medo enquanto os seguranças o seguiam pelo supermercado Carrefour, ou olhavam com desconfiança, pré-julgando por conta de ser negro; no ditado popular João os “encarava”.  Em função da herança escravocrata, os seguranças brancos não suportavam essa situação de um negro não baixar a cabeça para eles, e nem temê-los, isso é inadmissível.

            Então os capitães do mato, serviçais do Carrefour, resolveram dar uma lição no negro, diante da câmeras de monitoramento, celulares e a plateia cativa,  como era nos moldes do período da escravidão, nos pelourinhos espalhados pelo Brasil colônia, para que servisse de exemplo para outros negros e negras não ousarem andar de cabeça erguida dentro do supermercado Carrefour. 

          Os seguranças assassinos espancaram João Alberto até matá-lo, e mesmo gritando por socorro, dizendo que não respirava, não conseguiu fazer com que os assassinos parassem, tampouco provocou uma reação contundente na plateia cativa, que impedisse o seu assassinato cruel diante de todos(as). Quando os socorristas do SAMU chegaram ele já havia sido assassinado, não estava mais respirando, as tentativas de ressuscitação foram frustradas. 

            É evidente que houve uma ação deliberada de assassinar João Alberto, pois a violência só cessou quando João parou de respirar, isto é, depois que eles conseguiram matá-lo. Assim tem sido no Brasil, o medo, a apatia, e a nossa desorganização enquanto classe trabalhadora está permitindo a perpetuação dessa barbárie.

            Absurdamente a grande mídia divulgou uma suposta ficha corrida de delitos cometidos por João Alberto. Realmente nos tratam como idiotas, é notório que serve para plantar a divisão na opinião pública, entre os que consideram que ele deveria ter morrido por conta da tal “ficha”, os bolsonaristas, e os que se revoltaram contra a brutalidade cometida.  Assim foi com Marielle Franco, a direita neofascista também tentou vinculá-la às milícias, e assim tem sido no Brasil há séculos: encontrar justificativa para matar negros e negras. Agora vamos supor que a tal ficha corrida exista e que os seguranças a conheciam, então, reforça a tese de premeditação do crime de assassinato.

            Em situação semelhante ao assassinato de João Alberto, foi o assassinato pela polícia de Minneapolis, Minnesota, de George Floyd, nos Estados Unidos em 25 de maio desse ano, em que ele implorava dizendo que não conseguia respirar até ser morto. Uma onda de revoltas e indignação reverberou pelo mundo todo, com slogan: Black Lives Matter (vidas negras importam).

            O assassinato de João Alberto também gerou revoltas pelo Brasil e o aparato repressor do estado foi colocado à disposição para proteger a propriedade privada dos assassinos. Houve prisões, balas de borracha e bombas de gás lacrimogênio, para conter os que se revoltaram contra o genocídio do povo negro.

 

A resistência do povo negro

            Assim como João Alberto, o povo negro segue na luta de diferentes formas buscando combater a sua escravização. Durante o período colonial as rebeliões de escravos(as) deixavam os senhores escravocratas preocupados, havia muitas fugas, formação de quilombos. O quilombo de Palmares, liderado por Zumbi, em Alagoas no século XVII, foi referência da luta do povo negro, mas existiram muitos outros. 

            A revolta dos Malês, em Salvador, no século XIX, aconteceu na noite de 24 para 25 de janeiro de 1835, foi um levante bastante importante de escravizados de maioria muçulmana. Os malês queriam derrubar e ocupar as estruturas políticas, melhorando as condições de vida do povo negro.

            A partir da segunda metade do século XIX, as rebeliões de escravos cresceram e a pressão dos movimentos abolicionistas, as pressões internacionais, principalmente da Inglaterra contra o governo brasileiro tencionaram para assinatura da Lei Áurea em 13 de maio de 1888.

            As lutas dos Movimentos Negro Brasileiro não cessaram. De lá pra cá, muitas batalhas têm se travado contra o racismo estrutural no Brasil, que exclui negras e negros das políticas públicas. Os Movimentos Negro Brasileiro       lutam permanentemente pela regularização dos territórios quilombolas, que são alvos da especulação imobiliária e grilagem, fomentação de ações e políticas afirmativas que visa corrigir a exclusão social, ampliação da legislação que possa a fomentar ações contra o preconceito racial como, por exemplo, o Estatuto da Igualdade Racial, são importantes avanços, mas ainda insuficientes.

            Considerando que o sistema capitalista lucra com o racismo, é necessário organização e unificação das lutas antirracista, anticapitalista, antimachista, antifascista, com uma estratégia de poder da classe trabalhadora para combater o capital e libertar a humanidade da opressão e exploração.

 JOÃO ALBERTO, PRESENTE!


 

27 de nov. de 2020

DERROTAR A DIREITA EXIGE MILITÂNCIA PARA ALÉM DAS ELEIÇÕES, CONSCIÊNCIA DE CLASSE, O COMBATE DAS ILUSÕES E COERÊNCIA POLÍTICA

 


      As eleições municipais de 2020 chegam ao fim dando a maioria das prefeituras e cargos de vereança para os partidos do chamado “centrão” (leia-se: direita soft). O bolsonarismo perde força, embora ainda conserve apoio popular; e o petismo se reabilitou um pouco, apesar da campanha de “demonização” midiática contra o partido. Em algumas capitais, como Porto Alegre e São Paulo, ocorreram fenômenos positivos, ainda que muito limitados e que precisam ser avaliados com muito cuidado, como a ida ao segundo turno de Manuela D’Ávila (PCdoB/PT e cia.) e Guilherme Boulos (Psol e cia.). 

        O processo eleitoral demonstrou-se ainda repleto de ilusões – sobretudo entre a militância de esquerda/sindical – e, ao mesmo tempo, com muita descrença. Em Porto Alegre, cerca de 358 mil eleitores (33% do total) não compareceram às urnas. Dois problemas que se complementam, porque a militância sindical julga ser possível derrotar a direita e o neofascismo através das eleições e a abstenção não se transforma em ação política anti-regime e anti-sistema.

         Nós da Construção pela Base compreendemos que para derrotar a direita devemos manter uma militância ativa para muito além do processo eleitoral, desenvolvendo consciência de classe e combatendo a burocracia sindical e política que dominam os sindicatos e a vida política do país. Num momento de profundas ilusões eleitorais e de desmobilização geral não queremos contribuir com a polarização e a fanatização, que leva à dicotomização (o terreno preferencial do neofascismo). Não chamamos aqui voto nulo ou no PCdoB/PT, em Porto Alegre, ou no Psol e cia., em São Paulo – respeitamos e queremos dialogar com ambas posições, levando erros e acertos de cada uma delas em consideração. Somos nitidamente conscientes do papel cumprido por MDB e PSDB, que são máfias políticas que dominam o aparato estatal burguês há décadas e governam com mãos de ferro contra os trabalhadores, o que, obviamente, exclui qualquer silêncio em relação a eles.

         Contudo, nos sentimos no dever de alertar contra certos exageros e demagogias que são oriundos do desespero eleitoral que resulta de ocasiões como estas.

 

MDB e PSDB: máfias burguesas que estão interligadas ao projeto econômico bolsonarista

         A maioria das análises das organizações de esquerda estão corretas acerca do caráter e da atuação de MDB e PSDB, por isso não nos cabe acrescentar nada mais. MDB é um antro dos maiores casos de corrupção do país, além de ser o campeão do fisiologismo, estando em qualquer governo federal. O PSDB é o “senhor feudal” do Estado de São Paulo, massacrando os trabalhadores e os usando como vitrine para todos os experimentos neoliberais de retirada de direitos e exploração desapiedada. Não é casual que a maior e mais rica cidade do país conviva com casos de miséria extrema e a fome. Nesse sentido, não temos dúvidas de que PCdoB e Psol são diferentes do MDB e do PSDB e divergimos de quem coloca um simples sinal de igual entre todos estes partidos. Porém, nos preocupa o nível de ilusões a respeito das eleições, que se transforma em ufanismo aberto, quando não em desespero.

         Em Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), que votou contra o plano de carreira dos educadores estaduais, ataca Manuela falando que ela é “comunista” e “estatista”. Tais fake news se proliferam com certo consentimento da própria candidata, que não os rebate nos debates ou mesmo posteriormente. O PCdoB não é “comunista” (nem no sentido “correto”, nem no sentido da ex-URSS); tampouco é estatista. Basta olhar para a atuação do PCdoB nos governos Lula/Dilma, com o código florestal proposto pelo seu deputado, Aldo Rebelo; ou mesmo o seu governador do Maranhão, Flávio Dino, além do perdão da dívida das igrejas evangélicas. O PCdoB nunca ameaçou e não ameaça a propriedade privada e a Constituição (burguesa) de 1988. Ao contrário, tem sido um dos seus mais fiéis defensores. Tampouco caminha no sentido do desenvolvimento da consciência de classe – basta ver sua atuação nos sindicatos.

         Manuela também não pode ser acusada de “estatista” por proteger a manutenção de determinados serviços públicos ou por defender, corretamente, a manutenção da Carris como empresa pública contra os intentos privatistas de Melo (feito, no mais das vezes, para agradar demagogicamente o eleitorado bolsonarista, que, para além do preconceito e do seu interesse imediato, não entende nada de “comunismo” e tampouco de capitalismo e privatização). O PCdoB não tem a menor intenção de “estatizar” nada, nenhuma empresa, multinacional ou o que quer que seja. Esta afirmação, como vimos, está embasada pela prática de PCdoB e PT. Tampouco a pecha de “radical” pode ser pregada em Boulos, dado que ele se aproxima do empresariado paulistano e “dialoga” com vários setores, além de afirmar que não irá demonizar o setor privado. Não propõe, tal como o PCdoB também não propõe, nenhuma mudança político-institucional ou constitucional e mantém-se nos limites da retórica lulista da “esperança vencer o medo e o ódio”.

         Já MDB e PSDB vão continuar retirando direitos, massacrando servidores públicos e garantindo a exploração desenfreada de trabalhadores. Ou seja, não em palavras, mas na sua prática concreta garantirão o Estado como instrumento pleno e eficaz do capital privado, transformando os impostos em subsídios e “incentivos” ao grande capital; isto é: trabalharão a todo vapor pela “uberização” da economia e dos direitos trabalhistas, tal como faz Bolsonaro. Não podemos esperar nada diferente destes partidos e qualquer trabalhador ou trabalhadora que votar neles estará votando contra si mesmo (seriam casos de ignorância, vantagem pessoal ou masoquismo?).

 

Cuidado com as ilusões!

         Mas se Manuela e Boulos não são “comunistas”, “estatistas” e respeitarão totalmente a institucionalidade burguesa, farão o mesmo que Melo e Covas? Não! A diferença entre tais projetos diz respeito, sobretudo, ao que fazer com o orçamento de governo. Como representantes da direita, Melo e Covas subsidiarão o empresariado com verbas públicas em detrimento dos serviços públicos, do emprego, da moradia, do transporte popular, etc. Manuela e Boulos, por sua vez, utilizarão as fórmulas aplicadas pelos governos petistas, de “distribuir” alguma renda por dentro do Estado burguês e da sua institucionalidade, lembrando bastante as orientações de instituições financeiras como o FMI, Banco Mundial, etc., que apregoam uma certa compensação à “questão social” como forma de evitar que o aprofundamento das desigualdades sociais inviabilizem a ordem e o próprio funcionamento do sistema. Isso não é melhor do que projeto de Melo e Covas? Sim, mas a longo prazo é um paliativo desmobilizador, tal como nos demonstraram os governos petistas.

         Manuela fala em ser uma candidata anti-bolsonarista e alguns acham que isso, por si só, não apenas se justificaria, como seria extremamente progressivo. Basta olhar, contudo, as alianças do PCdoB a nível nacional: em 70 cidades está coligado com o PSL de Bolsonaro (enquanto que o PT repete a façanha em 140 municípios, segundo os dados do TSE); em 194 cidades está coligado com o MDB, de Melo (enquanto que o PT está com os velhos amigos em 606 cidades)[i]. E o Psol, de Boulos, recebe o apoio de PCdoB e PT em São Paulo e Porto Alegre. Tratam-se de coligações e apoios pragmáticos e importantes nesse momento, dirão alguns. Cada um conclua o que quiser e seja pragmático em nome da “governabilidade” o quanto desejar, mas não joguem a experiência de 13 anos de governos petistas no lixo.

 

PCdoB e PT defenderão os serviços públicos?

       Um dos grandes argumentos favoráveis aos candidatos da “esquerda” afirma que as candidaturas de PCdoB, PT e Psol, ao contrário das mdebistas e tucanas, defenderão os serviços públicos. Este é o principal motivador de um apoio eleitoral desesperado pra muita gente. Mas cabe perguntar se de fato os primeiros defenderão os serviços públicos contra os segundos? Se comparados ao MDB e ao PSDB, podemos afirmar que sim. No entanto, isso não é um grande mérito, sobretudo se lançarmos um olhar mais atento sobre como se dá esta defesa.

         Se levarmos em consideração que se torna cada vez mais patente o surgimento de um “Estado amplo”, controlado pelos monopólios e trustes internacionais, que não reconhecem os limites das fronteiras e legislações nacionais, estaduais e municipais em contraposição ao um “Estado restrito”, que é o Estado “tradicional”, com suas instituições políticas circunscritas ao seu território, mas subordinadas e dependentes deste poder econômico superior, podemos concluir que há limites evidentes para o poder executivo e legislativo. O central seria que os “nossos representantes” nestes partidos de esquerda lutassem conscientemente contra este “Estado amplo”. PCdoB e PT lutaram? E o Psol, grande respeitador e impulsionador da institucionalidade burguesa, o fará?

         Nesse caso: elegemos “representantes”, governos e “legislamos” no Congresso Nacional, nas Assembleias Estaduais e nas Câmaras de Vereadores para quê, uma vez que o poder do “Estado amplo” (isto é, dos monopólios de mercado) asfixia e torna inócua toda a legislação que limite seu poder? Para isso, basta ver a situação das multinacionais frente ao governo do Estado – se falamos em cobrar os impostos devidos elas ameaçam ir embora e os governos aceitam tudo docilmente. Assim, em razão das contradições do capitalismo, cada vez mais o “Estado amplo” vai solapando as verbas destinadas aos serviços públicos e mesmo Manuela ou Boulos terão margem muito limitada para defendê-los. O correto seria se enfrentar conscientemente contra tal estrutura – o que inclui a institucionalidade burguesa –, transformando tal enfrentamento em uma luta pública. PCdoB, PT e Psol o farão? Muitos dos seus apoiadores gritarão que “sim”! Contudo, nós temos muitas razões para desconfiar e nos colocar em estado de alerta e prontidão. Sobretudo o fato de Manuela ser acrítica em relação à Fundação Lemann, a mesma que assinou convênio com o governo Leite (PSDB) e pretende tomar conta da educação pública[ii].

Manuela e Boulos podem ter boas intenções em relação aos serviços públicos – se comparados a Melo e Covas –, mas sem lutar duramente contra o “Estado amplo”, a institucionalidade burguesa e a hegemonia do mercado privado sobre a economia, a longo prazo farão o mesmo que Lula e Dilma.

 

A direita sempre governa através da institucionalidade burguesa

         O problema central das eleições é a institucionalidade burguesa a qual os candidatos que forem eleitos terão que lidar. PCdoB e PT não apenas não combatem tal institucionalidade, como a reforçam. O que fizeram em 13 anos de governo federal? Tal “vitória” contra a direita nas urnas é solapada pelo funcionamento da institucionalidade que se segue e isso não é sequer lembrado por quem hoje está numa campanha frenética pela “vitória” da “esquerda”. É esta institucionalidade que compromete toda a gestão “popular” e que fortalece a direita que supostamente é derrotada nas urnas, que precisa ser desmascarada e explicada pacientemente aos trabalhadores e às trabalhadoras. De uma forma ou de outra a direita governa sempre através da institucionalidade burguesa. Reconhecer isso não seria importante? É esta a verdadeira “unidade” que falta à “esquerda”.

         Foi este um dos tristes resultados dos 13 anos de PT e PCdoB à frente do governo federal. Nada foi feito neste tempo para derrotar a direita ou modificar a estrutura do país (um reformismo sem reformas). O golpe é resultado das alianças espúrias, da falta de política concreta para mudar o país e combater as elites e a direita nacional. Ao contrário, além de dar “lucro recorde aos bancos”, o petismo levava a passar os caciques da direita tradicional como grandes aliados, respeitáveis e confiáveis. Votem na Manuela ou no Boulos, denunciem Melo e Covas (e nós estaremos com vocês), mas nunca esqueçam disso e jamais minimizem tais problemas!

         Parte da institucionalidade burguesa se encontra sobretudo nos sindicatos e nas entidades estudantis, a quem PCdoB, PT e mesmo o Psol dirigem com mãos de ferro e uma política paternalista que gera inúmeras ilusões na justiça e nas eleições burguesas. Reforçam direta ou indiretamente a burocratização sindical e está aí, certamente, uma forma central de enfraquecimento dos trabalhadores e de “fortalecimento da direita”.

 

Votar contra a direita... mas sempre com consciência de classe!

         Compreendemos nitidamente o momento delicado que vivemos – de ascensão da direita neofascista – e dialogamos com todas as posições que expressem, de alguma forma, resistência em defesa da classe trabalhadora. Não achamos, contudo, que o centro da luta contra tal direita se dê via eleições e institucionalidade burguesa (evidentemente o terreno do inimigo, que não pode ser embelezado sob hipótese alguma).

         No entanto, não concordamos com a agitação da Transição Socialista (antiga Negação da Negação); não porque supostamente “fortaleça a direita”, conforma o jargão oportunista, mas porque não consideramos que Manuela seja igual a Melo, nem que Boulos seja igual a Covas. Tal agitação equivocada simplesmente reforça todas as ilusões que supostamente quer combater, jogando os eleitores de “esquerda” nos braços dos candidatos “reformistas” e ajudando na polarização/fanatização. As ilusões são grandes e profundas, como podemos constatar e, como não existe um movimento de massas que se ponha como alternativa nítida e firme neste momento, tal polarização não ajuda em nada, mas atrapalha. A unidade dos trabalhadores deve se dar com muita paciência revolucionária. Não se pula etapas apenas simplificando a realidade, que não pode ser simplificada.

         Respeitamos as duas posições que não votam na direita: tanto a que decide por Manuela/Boulos quanto a que optou pelo voto nulo. Não concordamos com o desespero eleitoral, que transforma a passividade do voto de 2 em 2 anos numa solução milagrosa que evidentemente não é. Não achamos que um governo de “esquerda” eleito para o Estado burguês seja, necessariamente, uma forma de “acumular forças” para a luta da classe trabalhadora. Pode significar uma vitória de Pirro, tal como os 13 anos de frente popular no governo federal. Sobre essa experiência podemos perguntar: chegamos perto de derrotar a direita ou a fortalecemos?

         Por tudo isso, cuidado com a dicotomização e o desespero eleitoral. Respeitem as opções de quem é trabalhador e tem consciência de classe. Não embelezem o que não deve ser embelezado, nem prometam o que não pode ser cumprido por tal “esquerda”. Podemos considerar que há um equívoco no voto nulo neste momento, mas serão estes companheiros e companheiras que estarão conosco, ombro a ombro, quando os governos eleitos começarem a nos massacrar, de uma forma ou de outra – e eles farão por vocação ou por pressão do sistema sobre os “governos populares”! Quem discorda que coloque a mão no fogo! O “voto nulo” não se restringe aos setores da “esquerda”. 358.217 pessoas não votaram nessas eleições – cerca de 33,08% do eleitorado porto alegrense (a maior abstenção entre as capitais brasileiras); um aumento de 11% se comparado a 2018[iii]. Xingar 33% do eleitorado por se abster resolveria algo? Dialoguem (e não agridam) quem se abstém. Critiquem sua passividade política e não os faça voltar de joelhos para a institucionalidade burguesa. Reflitam e procurem entender sinceramente suas razões; não projetem neles o desespero eleitoral. Uma política cínica e anti-trabalhador levada a cabo por “governos populares” tem mais responsabilidade pelo fortalecimento da direita do que o voto nulo.

         Da nossa parte, estaremos como sempre estivemos: denunciando a direita, orientando os modestos setores da classe trabalhadora que atingimos a não votarem na direita e ombro a ombro com quem vota no PCdoB/Psol ou nulo. Nosso norte é a revolução socialista e o nosso método é o realismo revolucionário. Não acreditamos em saídas institucionais, por mais que não desprezemos a sua boa utilização (o que não é o caso feito por PCdoB/PT e Psol), que cruzam todos os limites nesse sentido.

         Não se vence a direita neofascista e o capitalismo sem coerência, sem que nossas ações confirmem nosso discurso, sem que tenhamos, bem acima do desespero eleitoral, uma conduta ética ligada aos interesses históricos da classe trabalhadora, que não podem ser defendidos e conquistados com métodos institucionais de bastidores, alianças espúrias com a mesma direita que criticamos, com um sindicalismo burocrático ou embelezando com a nossa vontade íntima o que jamais poderia ser embelezado.


- Dia 29 de novembro vote com consciência de classe: não vote na direita!

- Derrotar a direita exige militância para além das eleições, consciência de classe, o combate das ilusões e coerência política; pressupõe, sobretudo, a luta contra o capitalismo!

- Nenhuma ilusão na institucionalidade burguesa (judiciário, legislativo, executivo “popular”, mudança através do voto dentro da democracia dos ricos): só a luta revolucionária muda a vida!

- Respeito e diálogo entre as vertentes de pensamento eleitoral dentro da classe trabalhadora!


- Contra o desespero eleitoral! Não passem a ansiedade burocrática e ilusória para os trabalhadores: fortaleça a esquerda e enfraqueça a direita lutando contra a burocratização sindical e tomando nas mãos as nossas responsabilidades políticas e sociais todos os dias e não apenas de 2 em 2 anos!

 

Referências