20 de jun. de 2019

15M E 14J: GREVES GERAIS OU VÁLVULAS DE ESCAPE?



As “greves gerais” convocadas para os dias 15 de maio e 14 de junho levaram milhares de pessoas às ruas, mas também colocaram um problema fundamental não debatido pelo movimento sindical: o que fazer após estas mobilizações? As “greves gerais” com data e hora marcada foram bastante divulgadas, mas não tiveram nenhum tipo de trabalho de base real prévio, que acabou levando uma massa para a rua sem nenhum tipo de ligação, organização ou programa. Sendo assim, estas “greves gerais” se tornam presas fáceis dos governos, da mídia e do próprio desânimo dos manifestantes, que sucumbem como resultado da falta de perspectiva.
         A falta de perspectiva, porém, existe apenas para os manifestantes independentes. As grandes centrais sindicais seguem à risca o seu cronograma de fazer manifestações pontuais que não questionam nenhum pilar da institucionalidade e do sistema, focando apenas em determinadas políticas de governo com a finalidade de desgastá-lo visando as próximas eleições.
         Esta postura não tem nos levado a lugar nenhum, bem como as “greves gerais” de apenas 1 dia! Basta olharmos para a Grécia e a Argentina – países que foram campeões de “greves gerais” deste tipo. A Grécia continua esmagada pela Troika, que terminou por impor “acordos financeiros” que engendram a sua futura crise econômica; e a Argentina acabou por eleger o famigerado governo de Maurício Macri, que está aplicando impiedosamente os planos do FMI. Por aqui, seguimos para o mesmo desfiladeiro, sem nenhuma perspectiva além da institucionalidade burguesa e do capitalismo. As direções das centrais estão perfeitamente conscientes do uso de tais tipos de “greves”. A “esquerda” (tanto as grandes, quanto as pequenas organizações) está satisfeita com estes movimentos. Criticam determinados pontos da política das centrais, mas não veem problema algum neste “método” de “greve geral”. Portanto, não há questionamento real destas direções, que se vendem como “lutadoras” ao convocarem estas “greves”, que na verdade não passam de um dia nacional de lutas.
         A energia do movimento dos trabalhadores tem sido usada, desde então, para fins exibicionistas das centrais sindicais ultra burocratizadas e institucionalizadas; não servindo para preparar uma organização superior de sindicalismo que possa abrir caminho para saídas revolucionárias visando novas formas de organização social. Assim, estas “greves gerais” tem se constituído em verdadeiras válvulas de escape do descontentamento popular, terminando por aliviar a panela de pressão do sistema. Na atual conjuntura, parte fundamental da contenção das massas tem se dado, justamente, a partir destas propostas inconsequentes de “greve geral” sem continuidade, organização, trabalho de base e coerência com uma transformação revolucionária da sociedade. Para fins eleitoreiros, em contrapartida, servem perfeitamente! É por isso que quem não compreende este “pequeno detalhe” e convoca tais “greves gerais” na expectativa de que elas mudem a conjuntura, acaba ajudando a sustentar toda esta farsa.
         Não foi casual que enquanto a CUT posava de combativa para todos os movimentos sociais, governadores petistas estavam sentados com o governo Bolsonaro (PSL e comparsas) para “negociar pontos da Reforma da Previdência”[i].

Sobre a adesão
         Ficou visível que adesão à greve se restringiu ao funcionalismo público (educação e saúde) e à juventude. Algumas categorias se mobilizaram parcialmente, como petroleiros e bancários. No entanto, a maioria esmagadora do setor privado ficou alheia ao movimento, incluindo os rodoviários. Para tentar reverter o quadro, fizeram piquetes nas portas das empresas de transporte público, mas sem um trabalho de base prévio nestas categorias não é possível impor a adesão (a não ser, é claro, que se tratasse de uma greve de massas realmente e apenas os rodoviários se recusassem a parar). Tudo isso demonstra claramente que há muito a ser feito, exigindo de nós um novo curso sindical e uma reformulação de todo o trabalho de base.
         Grande parte da preparação, dos debates e dos calendários de mobilização foram feitos ou divulgados apenas nas vésperas, sem nenhuma consequência ou relação entre si. Se não há clareza e organização suficiente não é possível deflagrar uma greve geral. Poderemos derrotar governos decididamente empenhados em nos retirar direitos, que além de tudo contam com o apoio da grande mídia e do empresariado, fazendo uma “luta” com esta disposição e estado de espírito?

O duplo poder nas greves gerais verdadeiras
         As grandes greves gerais da história foram antessalas de revoluções. Em 1905, na Rússia, deram à luz aos sovietes, que eram os conselhos operários e populares que tomariam o poder em 1917. No Brasil, também em 1917, tivemos uma adesão massiva a uma greve que paralisou toda a produção. Para isso existiu um longo trabalho de base prévio e determinadas condições.
Em Porto Alegre surgiu a Liga de Defesa Popular, que servia como uma espécie de duplo poder entre o governo Borges de Medeiros e os grevistas, levando à reorganização de todo o funcionamento de serviços municipais de vital importância, como transportes e a própria produção e distribuição. Em São Paulo surgiram as ligas e corporações operárias, que culminaram no Comitê de Defesa Proletária. Estes organismos tomaram o controle da cidade por 30 dias. Leite e carne só eram distribuídos a hospitais e, mesmo assim, com autorização da comissão de greve. O governo acabou abandonando a capital. Além disso, decretaram liberdade a todas as pessoas detidas por motivo de greve. Outras conquistas econômicas e sindicais também foram arrancadas da burguesia[ii].
         Vivemos hoje exatamente o oposto: estamos na defensiva, a burguesia organiza governos neofascistas, as manifestações não têm coerência e perspectiva, muito menos apostam em organismos como os de 1917. Sem falar que grande parte do setor privado segue alheio ao movimento. Parte fundamental disso se deve ao caráter das direções sindicais e políticas da “esquerda”. Simplesmente “radicalizar” o movimento com ações descoladas da massa ou com palavras de ordem artificiais (“fora este ou aquele” sem correlação de forças, dentre outras) não resolve o problema, mas o agrava. Mudar estes métodos estéreis exige uma luta firme, consequente e de longo prazo contra as burocracias sindicais, o espontaneísmo e a impaciência; sobretudo mantendo coerência entre os métodos de agitação, propaganda e de organização dos trabalhadores pela base. Nessa perspectiva é fundamental combater toda e qualquer política deslocada da real correlação de forças entre os trabalhadores e a burguesia.
         Ao invés de acumular forças – como sonham ativistas e organizações de esquerda –, estas “greves gerais” apenas dissipam energias. É por isso que pra mudar o curso delas, o primeiro passo é não participar de tais “movimentos” acriticamente como se estivéssemos no caminho correto, fingindo que não vemos e sentimos todas as suas contradições.


NOTAS


5 de jun. de 2019

A DEMISSÃO DOS EDUCADORES CONTRATADOS EM LICENÇA SAÚDE REVELA QUE O PROBLEMA É MUITO MAIS GRAVE

Nestes últimos dias parte da atenção da sociedade gaúcha se voltou para a política desumana e cruel do governo Leite (PSDB e aliados) de demitir educadores contratados em licença saúde. Houve uma comoção generalizada, obrigando governo, parlamento e grande mídia a se explicar. Isso foi o resultado de um esforço coletivo de várias organizações e ativistas, cabendo destacar o papel do Comitê dos Educadores Contratados.

Comitê dos Educadores Contratados em manifestação neste dia 3 de junho

Agora, como este tema veio a público, querem reduzi-lo ao máximo, minimizando suas graves contradições. Por um lado, o governo e a mídia (em especial a RBS), tentam esconder a política preferencial dos governos de contratação "emergencial", procurando naturalizar a demissão dos contratados que não estão doentes, preparando a futura política do governo Leite de terceirização da educação pública.

A nota do governo, reproduzida integralmente pela RBS, afirma que "a contratação temporária é realizada para suprir, com urgência, determinadas necessidades do serviço público e não garante ao servidor estabilidade". Na mesma reportagem a RBS "constata" que se tratam de educadores com mais de 10 anos de contrato, logo, não são casos de urgência, até porque, faltam mais de 6 mil educadores nas escolas públicas gaúchas (o que não é lembrado nem pelo governo, nem pela RBS). Para dar um "ar de legalidade" para a sua atrocidade, a SEDUC invoca uma orientação da PGE/RS que segue os termos do artigo 59, da lei n. 3213/81, ou seja, de uma legislação anterior a Constituição de 88.

Lembramos que o assédio moral corre solto contra esses trabalhadores diariamente, não apenas nos casos de licença saúde, que se tornaram absurdamente escandalosos. Para mudar esta realidade não será suficiente alguns concursos públicos, por mais importantes e "legais" que sejam, mas uma política consciente por parte do CPERS para combater de frente a precarização do trabalho, que desautorize e destrua a política preferencial pela contratação "emergencial" no funcionalismo público mantida pelos governos e pelas organizações neoliberais, como a RBS.

Entendemos que a falta da bandeira de luta da "efetivação" destes educadores, com plenos direitos, abre margem para todo este espetáculo nefasto que estamos acompanhando agora. Relembramos que a direção central do CPERS e muitas de suas correntes sindicais nada fariam em relação aos contratados se não houvesse uma movimentação autêntica vinda da base. A recusa em defender direitos e a efetivação como sendo uma “violação da Constituição e das leis” por parte da direção central do CPERS, usada quase como uma fatalidade divina, não passa de uma opção política de deixar os trabalhadores mais precarizados de sua própria categoria sem apoio algum.

Reiteramos a fundamental importância do Comitê dos Educadores Contratados e da necessidade de todos os poderes, organizações sindicais, políticas e parlamentares de a levarem em consideração, afinal de contas, o tempo da escravidão passou e os trabalhadores precarizados devem ser chamados para debater aberta e conscientemente a sua própria condição. Qualquer outra política diferente desta é apenas dividir a luta e as nossas forças, servindo para fortalecer a política do governo Leite.