Cenas da vida cotidiana de Alvorada, a 6ª cidade mais violenta do Brasil |
Alvorada é uma cidade da
região metropolitana de Porto Alegre, mas tem características de cidades do
interior do país que nos remetem à triste época do coronelismo da República
Velha (1889-1930). Tanto o prefeito de Alvorada, José Arno Appolo do Amaral (MDB), quanto o de Viamão, André Nunes Pacheco (PSDB, herdeiro do clã dos Bonattos; substituído posteriormente por Valdir Jorge Elias, o “russinho”), governam praticamente sem nenhum tipo de oposição séria, promulgando leis arbitrárias que não encontram resistência dos movimentos sociais e sindicais.
Em
Alvorada se criou a terrível imagem de “cidade dormitório”, onde seus moradores
devem acordar cedo para ir trabalhar em outra – geralmente em Porto Alegre – e
voltam apenas para dormir. Tal visão, complicada e atrasada, encontra um
vergonhoso respaldo, inclusive, nos textos da BNCC. Já é hora de dizer
claramente que o povo de Alvorada merece ter sua própria cultura e criar as
condições para desenvolver a sua própria cidade, política, econômica, social e,
é claro, culturalmente. Esta visão de “cidade dormitório” a condena a uma
eterna subserviência e a uma profunda falta de seriedade para consigo mesma. Os
prefeitos-coronéis dessas cidades deitam e rolam nessa mentalidade,
aproveitando-se para governa-las como aproveitadores e tiranos.
A
forma da administração pública adquire contornos autoritários que contrariam a
legislação vigente no país – que como costumamos lembrar, geralmente, é
respeitada apenas em casos que vão contra os interesses dos trabalhadores. Em
específico, quando falamos da educação pública de Alvorada e Viamão, podemos
constatar que os partidos de direita (MDB e PSDB) apoiadores das medidas do
governo Bolsonaro (ex-PSL, e hoje inconstitucionalmente “sem partido”) as
utilizam como um grande laboratório que, uma vez obtendo “sucesso” – como
parece ser o caso –, devem ser aplicadas a nível estadual também. O caso mais
escandaloso – praticamente aceito sem nenhuma resistência pelos movimentos
sociais e sindicais das duas cidades – é a imposição de diretores nas escolas
municipais, ignorando toda a legislação e a prática vigente de eleição de direções.
É o mesmo que pretende Bolsonaro com a imposição de reitores nas universidades
federais.
Tal
medida escandalosa tem a clara finalidade de dificultar qualquer tipo de luta e
resistência em defesa da escola pública, recriando o ambiente autoritário da
República Velha e de certos tipos de “fidelidade pessoal” e subserviência política
ao prefeito. Dentro dessa lógica nefasta, o prefeito alvoradense, José Appolo
do Amaral, que já teve sérios problemas de irregularidades na sua posse em 2016[i], avança ainda mais contra
a gestão democrática da escola pública: autoritariamente destitui o Conselho
Municipal de Educação de Alvorada (CMEA). A lei “proposta” pela prefeitura e
aprovada de forma unânime pela Câmara de Vereadores – que contava, inclusive, com
4 vereadores do PT[ii] – é anticonstitucional e, sobretudo, imoral, uma vez que rompe com o princípio
básico elementar e universal de eleger
um órgão fiscalizador de um poder público e não que o poder que deveria ser
fiscalizado tenha o “direito” de indicar aqueles que vão lhe fiscalizar[iii].
Antes
da alteração aprovada pelos vereadores, a Lei Municipal 1.119/2000 estabelecia
que os representantes nomeados pelo prefeito deveriam ser escolhidos pelas suas
respectivas categorias (professores, servidores, pais e estudantes). A nova lei
exclui a necessidade de escolha da sociedade e dá ao prefeito a liberdade de
indicar todos os 15 membros do Conselho e seus suplentes[iv]. Os objetivos do prefeito
de Alvorada são claros: beneficiar o ensino privado em detrimento do ensino
público, seguindo uma tendência nacional e estadual. Aliás, está sendo pioneiro
na aplicação de projetos que retiram verbas da educação pública e a destinam
para o ensino privado – tal como também faz Marchezan Junior (PSDB) em Porto
Alegre comprando vagas nas escolas infantis privadas com dinheiro público – e
na destruição da legislação da gestão democrática do ensino público. Na esteira
destes projetos vem uma série de retirada de direitos e a ameaça concreta de
redução salarial, término compulsório de convocações e mesmo abre precedentes
para a demissão de servidores e/ou terceirizados (e tudo isso em meio a um
decreto estadual de “calamidade pública”, onde direitos dos pequenos
supostamente deveriam ser assegurados em detrimento dos grandes).
Na
denúncia para a ouvidoria do TCE-RS, a presidente destituída do CMEA explica
que foi informada apenas pelo sindicato dos municipários de que a nova lei
estava em vigor e que já existia um “novo” conselho. Ela ainda denuncia que a
paridade entre ensino público e privado foi abolida na nova lei, garantindo que
os membros representantes da rede privada sejam maioria. O antigo CMEA,
destituído autoritariamente, não foi consultado em nenhum momento sobre tais
alterações, o que não impediu que numa conivência inaceitável, a “ouvidoria” do
TCE respondesse que “não se trata de falta de transparência”, pois o “tema já vinha
sendo debatido pelo poder legislativo desde 2019”.
Ou
seja: uma mudança feita em meio a uma pandemia, que dá o poder do prefeito
indicar conselheiros “amigos do rei” e que em nenhum momento foi debatida com
os conselheiros vigentes ou com as comunidades escolares alvoradenses. Uma
vergonha para o poder legislativo, para a “democracia” de Alvorada e para a
justiça, totalmente conivente com toda esta farsa. Não casualmente, tal “justiça”
arquivou a denúncia e o processo contra tal arbitrariedade, tornando-se mais do
que cúmplice: virou parte do autoritarismo coronelista reinante em Alvorada.
Desgraçadamente, o movimento popular e sindical da cidade é cheio de ilusões
eleitorais e judiciais. Procura fazer uma luta meramente jurídica em detrimento
da luta política e de mobilização popular, por mais difíceis e incertas que
estas o sejam.
E
o que fez o CPERS diante de tudo isso? Como sempre, está completamente à parte
de todo este processo, como se isso não lhe dissesse respeito por se tratar de
uma esfera municipal. Mas nós afirmamos: o CPERS tem responsabilidade sim!
Primeiro, porque o núcleo que engloba Alvorada tem direito a um assento no
CMEA, e nem sequer fez uma denúncia ampla sobre o ataque da prefeitura contra
este conselho – a direção central certamente lavará as mãos dizendo se tratar
de um problema do núcleo (o que é parte da verdade, mas que não combate essa
prática horrorosa das instituições da democracia dos ricos de jogar toda a
responsabilidade sobre outras esferas, típica da politicagem burguesa);
segundo, porque se tal processo vinga em Alvorada, pode “subir” para outras
esferas, como a estadual, que está louca para acabar com a lei de gestão
democrática nas escolas públicas e já não reconhece em muitas questões
fundamentais o Conselho Estadual de Educação; e terceiro, porque somos parte de
uma única e mesma classe trabalhadora: por isso, devemos criar a consciência e
a tradição de que um ataque à educação pública de Alvorada é um ataque à
educação pública estadual e nacional, e vice-versa.
Frente
aos absurdos ocorridos em Alvorada, defendemos que o CPERS se torne parte desta
luta levantando as seguintes bandeiras:
- Revogação imediata da lei municipal 3.420/2020,
que é anticonstitucional e imoral!
- Respeito à Lei de Gestão Democrática
em Alvorada e Viamão: que os diretores sejam eleitos pelas suas respectivas
comunidades escolares!
- Por uma ampla denúncia da prefeitura
de Alvorada em todo o Estado e em todo o país, bem como de todos os poderes
cúmplices: nenhuma confiança nos políticos burgueses e nas suas instituições –
só a nossa luta direta decide! [isso não significa abrir
mão de ações judiciais e de participar de eleições, mas de subordinar tais
ações à luta direta, e não o inverso].
- Abertura de todos os processos, contratos
e relações entre a prefeitura de Alvorada e as instituições de ensino privado
da cidade!
NOTAS
[ii]
Ver: https://www.gazetadopovo.com.br/apuracao/resultados-eleicoes-2016-primeiro-turno/alvorada-rs/vereador/ o PT elegeu 4 vereadores, mas 3 usaram o partido como trampolim eleitoral e o deixaram, sendo que apenas 1 votou pela proposta (sendo expulso posteriormente). Este parece ser um fenômeno nacional (https://noticias.r7.com/sao-paulo/pt-perde-um-terco-dos-vereadores-eleitos-no-estado-de-sao-paulo-11052020). Cabe questionar de que vale um desespero eleitoral dos partidos de "esquerda" para acompanhar uma debandada de parlamentares eleitos depois das eleições justo na hora de votar contra projetos autoritários?
Nenhum comentário:
Postar um comentário