Até
quando um dito "dirigente"
vai
controlar tua consciência
e
ditar tua ação?
(Do Poema Base de alguém – Katiana, 8/9/2019)
Pela terceira vez
consecutiva e com o atraso de 1 ano, ocorreu no Fundaparque, em Bento
Gonçalves, na serra gaúcha, o X Congresso do CPERS. Reunindo cerca de 1800
delegados do Estado inteiro, o Congresso manteve o padrão dos anteriores, com
baixa qualidade de discussões, métodos autoritários e burocratismo. As
assembleias dos núcleos que elegeram os delegados foram “massivas” comparadas
com as que ocorrem nos períodos de greve ou de “normalidade”, o que demonstra
claramente que todas as grandes correntes da burocracia sindical jogaram peso
neste processo eleitoral para constituir suas maiorias artificiais. Que tipo de
sindicato poderíamos ter se elas agissem sempre para levar o máximo possível de
educadores para as assembleias regionais?
As mesmas correntes que gritam no
congresso pela “unidade da categoria”, são as que criam currais
eleitorais, baseados nos cochichos ao pé do ouvido para que “os outros” não escutem.
A diplomacia secreta tem matado o CPERS. Ela não foi debatida neste Congresso e
nem em nenhuma outra instância sindical. A política sustentada pela direção
central baseada na palavra de ordem de “eu
oriento a minha base a votar contra!”[i], já denunciada por nós no
balanço do IX Congresso de 2016, não apenas não foi superada, como se
aprofundou.
Por isso, os debates foram limitados e
viciados. As teses tiveram apresentações formais de apenas 7 minutos,
intercalados pela janta, com esvaziamento consentido do plenário. Cada uma das
19 teses traz boas contribuições que mereciam ser refletidas visando uma
síntese salutar. Porém, toda a riqueza delas não foi discutida, restando apenas
uma apresentação superficial para que as resoluções pudessem ser enfiadas goela
abaixo pelas maiorias artificiais. Um debate a toque-de-caixa e com este método
serve pra quem?
I - Regimento do Congresso:
organizar o debate ou restringi-lo?
Já no primeiro dia do seu Congresso
Estadual a direção central do CPERS impôs um regimento sem grupos de trabalho e
com o prazo final de entrega de resoluções para às 14h do seu primeiro dia,
antes da mesa de abertura. Isso impediu que os congressistas que quisessem
propor resoluções até o último dia do Congresso pudessem apresenta-las,
restringindo ainda mais o debate.
A justificativa para isso foi a de que
os debates de resoluções precisariam ser melhor organizados e sintetizados; e
que a ausência dos grupos de trabalho não prejudicaria o debate, que ocorreriam
direto no plenário. Seriam posições justas se as mesas encaminhassem a
discussão de forma correta e quisessem, de fato, chegar a uma síntese
democrática. Não foi o caso.
É característico dos Congressos do
CPERS a desorganização que atropela ou “encaminha errado” as propostas para a
votação. Se não fossem sindicalistas com mais de 20 anos de atuação, poderíamos
dizer se tratar de inexperiência. No entanto, estes debates atropelados
tornam-se parte do próprio burocratismo, que impede o debate democrático e
asfixia as minorias sem ter a menor vontade de se chegar a uma síntese.
Uma vez que o debate das teses foi pro-forma e os grupos de trabalho não
existiram, só encaminhar e votar as resoluções não aprofunda nenhum tipo de
debate. Assim, a discussão ficou restrita a este tipo de método, que serve
perfeitamente para camuflar diferenças e não esclarecê-las.
II - Turismo sindical
Muitos delegados foram levados ao
Congresso sem saber ao certo o que faziam lá. Outros tantos nem leram a tese
pela qual foram eleitos. Isto não foi uma exclusividade do X Congresso, mas tem
sido uma prática dos Congressos do CPERS. O fato de ser sediado na serra gaúcha
– uma região turística – não seria problema se não estivesse previsto na
programação um escandaloso “passeio cultural” (que ocupou a manhã de domingo) e
distribuição de garrafas de vinho, enquanto o restante da categoria segue miserável
e com os salários atrasados.
Somos favoráveis a integração da
categoria. O Congresso é uma grande oportunidade para isso. Uma festa e um
momento lúdico são importantes. Porém, feito de forma inescrupulosa, com
debates atravessados e superficiais, com um regimento antidemocrático e
votações mal encaminhadas, só podemos concluir que o turismo sindical, com suas
respectivas benesses, é parte desta política de dominação do aparato. Este é o
“trabalho de base” feito pelas correntes burocráticas para constituir as suas
maiorias. Uma vez que elas trabalhassem de fato na construção de um
sindicalismo combativo, falando a verdade amarga que precisam ouvir, não
sobrariam muitos para “contar a história”.
III - “Em terra de egos quem
enxerga o outro é rei”
Muitos delegados de base com quem
conversamos consideraram grande parte das discussões e falas marcadas por
disputas de egos. Isso é verdade quando observamos que muitos “dirigentes” não
se preocupam com o andamento do Congresso. Defendem praticamente a mesma coisa
que já foi defendido por outro apenas para subir no palco; exigem “declaração
de votos” nas abstenções; fazem demagogia com os ouvintes, bajulando-os; dentre
outras encenações.
Isso não quer dizer, de modo algum, que
muitos oradores não debateram e propuseram resoluções importantes e fizeram
falas justas e necessárias. Porém, a regra tem sido a exposição egocêntrica de
posições burocráticas e que pouco ou nada ajudam para o andamento da luta. Em
alguns casos, a entravam claramente. Ainda que pareça individualismo puro,
estes “egos” estão a serviço de uma política e de um programa.
IV - Lula livre, Lula solto
ou Lula preso?
Dentro deste contexto de restrição e
enquadramento dos debates se deu uma polêmica sobre a palavra de ordem “Lula
Livre”. Inevitavelmente, em razão de todo o método de construção das discussões
e das relações entre as correntes, os delegados e a construção do Congresso,
surgiram falsas polêmicas e debates estéreis, que terminaram por não encaminhar
nenhuma posição coerente sobre este tema importante da conjuntura.
A direita neofascista tem transformado
a prisão de Lula num estandarte político. Sabemos perfeitamente que hoje Lula é
um prisioneiro político, embora não seja o único. Existem tantos outros, como
Rafael Braga, por exemplo, sobre o qual nada foi falado. Porém, o caso de Lula
submerge com mais força porque é um ex-presidente da República; e o único preso
por tanto tempo. Por isso a prisão de Lula se tornou uma bandeira da direita,
da qual ela não pode abrir mão. Isto exige de nós uma posição. Por isso, esta
bandeira deveria ser debatida franca e abertamente não apenas no Congresso, mas
com toda a categoria.
Infelizmente, dado o alto nível de
burocratismo e de diplomacia secreta, isso não pôde ser debatido conforme a realidade
exigia. As correntes petistas e cutistas exageram sua importância, pois da
liberdade de Lula depende toda a sua estratégia política; e as oposições
burocráticas minimizam a gravidade desta prisão, levando água ao moinho da
direita. Somos a favor da liberdade de Lula, mas com as seguintes ressalvas: a
bandeira #Lula Livre tem sido usada
pela CUT como ponto central da sua agitação. Denota claramente que seu objetivo
é eleitoreiro: tudo depende da liberdade de Lula, pois é o único que pode
vencer eleitoralmente a direita neofascista na atual conjuntura. Novamente
vemos toda a estratégia política das centrais sindicais majoritárias e da “esquerda”
reformista em torno do campo minado das eleições.
Discordamos daqueles que não querem a
liberdade de Lula. Se houvesse correlação de forças favoráveis ao poder dos
trabalhadores e Lula fosse preso por dar lucro recorde aos banqueiros e ao
sistema financeiro, por fazer vistas grossas à administração dos fundos de
pensão pelo PT e pela ditadura que este partido exerce no movimento sindical
contra os trabalhadores conscientes de base, seríamos totalmente favoráveis a
sua prisão. Mas não é o caso. Ele está preso por motivos políticos e
eleitorais, com justificativas bizarras e forjadas, portanto, trata-se de uma flagrante
injustiça. Tudo piora quando observamos que Temer foi preso e solto em seguida
e outros ex-presidentes possuem centenas de imóveis, contas e ações ilegais e
estão completamente livres. Bolsonaro já está envolvido em diversos casos de
corrupção e nada acontece.
Portanto, somos a favor da liberdade de
Lula e contra a estratégia eleitoreira e burguesa do PT e da CUT. Seguiremos
debatendo estas questões com a categoria deste ponto de vista.
V - A preparação de um novo
golpe: a burocracia dirigente quer refiliar o CPERS à CUT!
Na esteira das discussões burocráticas
e sorrateiras, foi pautado e aprovado no Congresso o debate para filiação do
CPERS em uma central sindical. Escondidos sob distorções flagrantes, a
Articulação Sindical (tese 12) começa a preparar o terreno ideológico pra
enfiar uma possível refiliação goela abaixo. Ela diz: “entendemos que a atual conjuntura exige, acima de tudo, UNIDADE da
classe trabalhadora e para tanto será necessário estarmos filiados a uma
CENTRAL SINDICAL para o fortalecimento de nossas lutas no próximo período”[ii]. E mais adiante continua
sua verborragia sobre um suposto “comprometimento
da CUT com os trabalhadores em educação”. Neste Congresso as correntes
cutistas aproveitaram-se da estrutura política do evento para abrir o caminho
para refiliar o CPERS à CUT, aprovando por uma pequena margem o indicativo de
refiliação, que precisa ser referendado por uma assembleia geral da categoria.
A CUT há tempos está na trincheira
oposta. Por sua política sindical, ela não unifica a classe trabalhadora, mas a
divide. Tampouco combate o corporativismo das categorias. Na verdade, o
reforça! Age assim porque se adaptou totalmente ao Estado burguês e a sua
legislação. Seu sindicalismo é refém do eleitoralismo burguês e praticamente
todas as críticas presentes no Caderno de Teses ao afastamento do CPERS das
suas bases dizem respeito, em maior ou menor medida, ao sindicalismo cutista,
que leva o nosso sindicato a funcionar desta forma.
Escrevemos na nossa tese que “A desfiliação do CPERS da CUT foi uma
mentira. Rompeu formalmente com esta central, mas seguiu subordinado a ela não
apenas pelo fato de sua direção central ser orientada pela política oficial
cutista, mas porque segue filiado à CNTE (sua sucursal na educação). Ser contra
a CUT não significa ser contra as centrais sindicais em si, mas contra os
problemas de burocratização sindical criticado até aqui. Por isso, defendemos a
desfiliação do CPERS da CNTE, e que o dinheiro destinado a esta confederação
seja usado num fundo de greve, de mobilização e de formação controlado pelos
núcleos e, sobretudo, pela base. Para, além disso, precisamos romper com o seu
‘sindicalismo cidadão’, disseminador de ilusões reformistas e eleitoreiras”[iii].
Ou seja, o que a Articulação Sindical e
as demais correntes petistas querem é a legitimação da totalidade dos recursos
financeiros cabíveis do CPERS para a CUT (que se tornou, mais do que nunca, um
elefante branco sedento por verbas), uma vez que a orientação política e
sindical do nosso sindicato já é desta central. Defendemos a importância de uma
central sindical, porém, a esmagadora maioria das que existem sofrem dos mesmos
males. Não casualmente todas elas estão juntas nos momentos decisivos da luta
de classes e, em particular, na defesa das anti “greves gerais”. Compreendemos
que os recursos aplicados diretamente na luta são muito mais importantes para o
CPERS e para a nossa categoria. Inclusive reiteramos a necessidade de não dar
mais nenhum centavo para quem tem como proposta mexer no plano de carreira,
aceitar acordos rebaixados, apoiar as “reformas” da Previdência quando são
propostas por governos petistas e frear as lutas apostando no seu “sindicalismo
cidadão”. A CUT não reforça a consciência de classe e a luta dos trabalhadores;
mas forma e reforça consciências pequeno-burguesas.
Qual será a tática da Articulação
Sindical para refiliar o CPERS à CUT? Inflar as assembleias gerais com a sua
base burocrática, constituída em grande parte por “sócios aposentados” (que
somam cerca da metade das matrículas do CPERS), e o seu típico “trabalho de
base” de turismo sindical e distribuição de benesses que primem “pelo conforto e segurança da categoria”[iv]. Assim estarão garantidas
as maiorias artificiais que servirão para fazer o CPERS retroceder para a
década de 1990.
VI - Sobre o “Fora Bolsonaro”
Há tempos o CPERS agita as palavras de
ordem de “Fora este ou aquele”. Já exigiu “Fora Yeda” e “Fora Sartori”. Esta
última foi uma palavra de ordem agitada febrilmente desde o Congresso de 2016
em atos e manifestações de rua. Tal como Yeda, Sartori terminou o seu mandato
sem maiores sobressaltos. Nenhuma conclusão ou balanço foi feito de tais
agitações. Por este tema ser recorrente dentro do CPERS, nos parece que para a
imensa maioria das correntes é correto fazer qualquer tipo de agitação que
aparente radicalidade, mesmo que não haja correlação de forças para tanto.
Puxado pela Intersindical (tese 10), o debate
sobre o “Fora Bolsonaro” foi motivo de polêmica, mas acabou derrotado. Esta
discussão, no entanto, abre a possibilidade de uma reflexão para os futuros
“Fora este ou aquele” que certamente deverão ser levantados. O governo
Bolsonaro é uma catástrofe para os trabalhadores; e isso é uma visão unânime
das teses apresentadas ao X Congresso. É o resultado das táticas equivocadas da
“esquerda” e da manipulação midiática; além, é claro, da fraudulenta operação
Lava-Jato e da politicagem burguesa. Em 9 meses de governo está destruindo tudo
o que pode, inclusive fazendo a Amazônia arder. Sem sombra de dúvidas precisa
ser derrotado e afastado do poder o quanto antes. Porém, a correlação de forças
ainda lhe é favorável e nenhuma palavra de ordem radical poderá operar um
milagre. Ao contrário, facilitará a sua manutenção no poder.
As palavras de ordem e a ação da “esquerda”
brasileira quando não são abertamente oportunistas e degeneradas, são
infantilmente inventadas. Do ponto de vista da propaganda do socialismo estaria correto debatermos com os
trabalhadores a necessidade de tirarmos Bolsonaro pelas nossas mãos através da
luta e de uma revolução. E deste ponto de vista somos favoráveis a explicar
porque precisamos por Bolsonaro pra fora. Mas não é assim que a “esquerda”
compreende esta palavra de ordem, pois a trata como uma tarefa de agitação para
ser concretizada agora.
Antes de agitar “Fora Bolsonaro” devemos
perguntar: quem tem forças hoje para colocar Bolsonaro pra fora? A CUT, que
sabota qualquer luta independente? O CPERS, que é dirigido pela CUT-CNTE? O PT,
que foi deposto vergonhosamente pelos aliados de ontem e aposta todas as fichas
na institucionalidade burguesa e nas eleições? Ou seriam as pequenas centrais e
os pequenos grupos de militantes? Sem responder a estas perguntas, o “Fora
Bolsonaro” torna-se uma aventura; e uma forma de extravasar a raiva e o
desespero, sem que nada de concreto aconteça (tal como foi o “Fora Sartori”; e
dentro em breve será o “Fora Leite”). A questão aqui é que os trabalhadores não
estão suficientemente conscientes e nem suficientemente organizados para
concretizar uma ação tão decisiva quanto essa. Além disso, seus sindicatos
estão dominados por burocracias sindicais que são incapazes de levar qualquer
luta com coerência. Isso deveria ser admitido antes de pensarmos em uma palavra
de ordem tão séria para agitação de rua, que só pode ser agitada nas vésperas
de um movimento de massas em que os trabalhadores estejam suficientemente
organizados para tomar o poder e, que ainda por cima, tenham a perspectiva do
socialismo.
O “Fora Bolsonaro” como forma de agitação
significa hoje, concretamente, trabalhar para que o vice assuma (tal como
aconteceu com Dilma) ou desgastar o governo eleitoralmente para que algum outro
partido assuma o governo (mesmo o PT não teria condições de assumir hoje, dado
o seu desgaste pela direita). Sabemos que em todos estes casos nada mudaria (o
PT aliviaria a corda no pescoço por alguns anos, mas prepararia os futuros
golpes da direita). Hoje o “Fora Bolsonaro” significa “Viva Mourão!”. Ou os
camaradas acham que por um evolucionismo vulgar a palavra de ordem “Fora
Bolsonaro”, como que por um passe de mágica, irá crescendo numa maré montante
conforme os nossos desejos e fará o governo cair? Se isso é certo, porque não
aconteceu nada com o “Fora Sartori” e o “Fora Yeda”? Quais condições existem
hoje para um governo alternativo dos trabalhadores? Não seria isso tudo uma
demonstração de impaciência (ou até mesmo de desespero)?
Uma lógica mais correta nos diria que, como
ainda não temos condições de “botá-los todos para fora”, devemos nos centrar
nas palavras de ordem de acumulação de forças, de desgaste do governo do ponto
de vista revolucionário e não eleitoral; na luta contra a burocracia sindical para
destravar os sindicatos e os movimentos sociais. Não existem atalhos milagrosos
e não podemos cair em tentação de colocar a carroça na frente dos bois, pois
isso só prolonga a agonia e os próprios males.
VII - A confusão
constrangedora e premeditada no encaminhamento da votação sobre a organização
sindical e os contratados
As mesas que encaminharam as discussões
das resoluções agiram de forma burocrática e “erraram” em muitas discussões,
cabendo destacar os pontos sobre os contratados e a organização sindical
(existiram erros em outros pontos também, mas esses são suficientes para
ilustrar o seu método de funcionamento).
Durante a discussão de organização
sindical a mesa ignorou que existiam propostas diferentes no mesmo ponto,
fazendo uma ser votada contra a outra para eliminar todas as propostas
“indesejáveis”. Por exemplo: Articulação Sindical e outras correntes
apresentaram resolução sobre a reunificação do movimento sindical e das
centrais sindicais; o CEDS, o MLS, o Combate e Democracia e Luta apresentaram
proposta de abrir o debate sobre a filiação do CPERS a uma central sindical; a
CS apresentou resolução para reorganizar a luta no fórum dos servidores
públicos estaduais; Eloir de Oliveira apresentou resolução sobre a necessidade de
maior proximidade com as escolas Mbya Guarani; o Alicerce apresentou proposta
sobre fundo de greve; nós, da tese 1, apresentamos propostas sobre
reorganização das assembleias gerais, que necessitam ser organizadas pela base,
abertura dos comandos de greve para além das correntes e democratização dos
meios de comunicação do CPERS (Sineta, site, redes sociais, etc.).
A mesa, capciosamente, encaminhou uma proposta
contra a outra, como se tivessem o mesmo conteúdo e fossem contrárias. Venceu,
obviamente, a proposta da Articulação Sindical, que nada tinha a ver com as
demais propostas, eliminando-as todas. Pior do que isso: quando convinha, a
mesa destacava determinadas resoluções para votar em separado, como foi o caso
da resolução sobre as escolas Mbya Guarani. Assim, com uma só tacada
burocrática, a direção central eliminou o debate sobre fundo de greve,
reorganização das assembleias gerais, abertura do comando de greve e dos meios
de comunicação do CPERS.
Assustadoramente, poucos presentes
perceberam o método ardiloso de passar a patrola burocrática contra as minorias
e as discussões. Antecipou discussões que forçavam uma unidade fictícia para
tentar ludibriar os congressistas, com falsos sorrisos e aplausos; enquanto ia
cravando o punhal pelas costas, sufocando e patrolando as discussões com
encaminhamentos equivocados. Este método não é uma casualidade, mas a forma encontrada
pela burocracia para suprimir diferenças sem parecer autoritária.
***
O mesmo método foi utilizado no
encaminhamento do debate sobre os contratados. Numa atitude louvável, a
“oposição” unificou as resoluções em defesa da efetivação dos educadores
contratados em torno da tese 4, do Comitê Estadual dos Educadores Contratados.
Porém, a direção central encaminhou o debate de forma confusa, com a nítida
intenção de fazer vencer a resolução da Articulação Sindical, fazendo votar de
uma só vez propostas com temas diferentes.
Além disso, a defesa da direção central
não foi apenas mais do mesmo (batendo na sua tecla do concurso público), mas de
um baixo nível lamentável, fazendo reviver os preconceitos pequeno-burgueses da
categoria. Falou em “trenzinho da alegria” e “porta dos fundos”. Para se
contrapor a uma crítica bem armada, como foi a tese 4 (dentre outras), a
direção central precisou recorrer aos sentimentos mesquinhos, ao discurso de
ódio e de “superioridade aristocrática”. Para eles, os contratados não fazem
parte da classe trabalhadora e lhes exigir algum tipo de direito é algo inaceitável.
Isso é flagrante não apenas para a Articulação Sindical, mas para muitas outras
teses, que falam em “precarização das
condições do trabalho docente”[v], em abrir o sindicato para
as “demandas dos setores mais
precarizados da categoria, que tendem a aumentar cada vez mais”[vi], mas são incapazes de
formular uma política classista. Pior do que isso: as correntes cutistas não
conseguem manter o debate num nível elevado. Precisam recorrer a sofismas,
distorções ou a mesquinharias pequeno burguesas.
Apesar de tudo isso, o movimento dos
precarizados da nossa categoria – os contratados – cresce a olhos vistos. É por
isso que as correntes cutistas apelam para a calúnia e difamação contra quem
sustenta a palavra de ordem de efetivação. A direção central fala em
“secretaria da juventude”, em “renovar o CPERS”, mas não é capaz de formular
uma política que combata, de fato, a precarização do trabalho para os jovens
educadores. A única política que foi capaz de propor para a juventude enfrentar
os contratos “emergenciais” é aquela que afirma tacitamente: “você tem o emprego garantido até termos
concurso público! Depois disso você é tão descartável como uma garrafa pet!”.
Qual patrão não ficaria orgulhos dessa postura?
Para nós, ao contrário dessa política
patronal, a precarização do trabalho, a terceirização e o desemprego somente
diminuirão e serão derrotados quando aqueles que sofrem estas situações
obrigarem os empresários e os governos a aumentar o número de postos de
trabalho e a conferir-lhes estabilidade[vii]. A direção central do
CPERS, tal como os patrões, é totalmente avessa a esta luta.
VIII - O que esperar de um
Congresso e de um sindicato que não se importam com o socialismo?
Utilizando-se do método descrito acima
de “desorganização burocrática”, a mesa do debate sobre “plano de lutas”
simplesmente ignorou resoluções publicadas no caderno dentro de todos os prazos
previstos, trazendo à tona discussões secundárias e outras tantas demagógicas.
Na verdade, a desorganização conveniente serviu para ignorar debates
fundamentais, como a nossa resolução, que afirmava a necessidade de uma
estratégia socialista para a luta sindical.
Um trecho dela afirmava o seguinte: “As nossas lutas salariais e defesa dos
nossos direitos devem estar inseridas na luta pelo socialismo, isto é, pelo
controle dos trabalhadores sobre os meios de produção mediante a expropriação
da burguesia. Devemos fazer a propaganda do socialismo com base na realidade,
conscientizar pela propaganda concreta [e pela experiência]. Mostrar que não existe saída dentro do
capitalismo. Alimentar ilusões de que através das eleições burguesas os
trabalhadores podem governar o capitalismo significa trair e colaborar para o
fortalecimento da direita golpista contra a nossa classe...”[viii].
Para nós, o cerne da questão é a luta
contra o capitalismo. É cada vez mais patente que a luta contra ele é o que
pode assegurar um futuro para a humanidade. Todos os principais ataques
relatados na maioria das teses é fruto das suas necessidades econômicas,
políticas e sociais. Por isso, não denunciá-lo é um crime e uma traição. O
socialismo não pode ser uma saudação à bandeira e um discurso para consumo das
bases em dias de festa. A nossa luta sindical deve estar vinculada a uma
estratégia revolucionária e socialista. Nenhuma resolução – a não ser esta –
teve a preocupação de fazer esta vinculação e este debate no X Congresso do
CPERS. A triste constatação desse fato nos leva a perceber que o socialismo é
uma simples carta abstrata de intenções para grande parte das correntes que tem
um “S” de socialista em suas siglas.
Na contramão dessa perspectiva, a
principal corrente da direção central do CPERS propõe que “devemos aglutinar as pessoas e defender os ideais de democracia real,
liberdade, igualdade e direitos humanos. Esta deve ser a preocupação central do
próximo período...”[ix]. Como ela não tem coragem
de enfrentar a ideologia burguesa em voga – ao contrário, se submete à ela –,
quer jogar os ideais do nosso sindicato de volta para 1789.
IX - Proporcionalidade
combate burocratização ou apenas contempla cargos sindicais?
Como sempre, o debate sobre “reforma
estatutária” girou em torno da proporcionalidade na direção do sindicato e o
presidencialismo. Equivocadamente, muitas correntes apresentam a proposta de
proporcionalidade como um antídoto à burocratização sindical. Para nós, isso
não é verdade. A burocratização sindical deve ser combatida com um programa e
uma política revolucionária, que trabalhe conscientemente por organizar os
trabalhadores pela base. Somente quando essa organização fincar raízes e
avançar é que poderemos falar seriamente em combate à burocratização sindical.
Na atual conjuntura do CPERS, a proporcionalidade significa apenas o loteamento
de cargos na direção do sindicato entre as correntes organizadas. Portanto,
confunde e dificulta a organização pela base.
A diretoria executiva não representa a
opinião de toda a categoria, mesmo porque essa opinião não existe. A categoria
é dividida por opiniões diversas e muitas delas antagônicas. Se unifica apenas
nas campanhas salariais (e, ainda assim, parcialmente). As políticas gerais das
diversas correntes são distintas. A diretoria executiva é eleita para defender
uma determinada política, não todas as políticas. Mesmo nas diretorias
proporcionais, existe uma posição da maioria. Essa é a que vigora. A burocracia
não permitirá à minoria se expressar na imprensa sindical; e ela não terá mais
vantagem com a proporcionalidade do que já não desfruta como simples oposição.
A proporcionalidade, no atual contexto do CPERS, de nada serve à democracia
sindical e, muito menos, ao combate da burocratização sindical. Ao contrário, servirá
para gerar confusão e diluirá propostas combativas no leito morto do
burocratismo dirigente.
As diretorias sindicais são organismos
executivos eleitos em torno de um programa. Não podem colocar em prática dois
programas. A unidade para a luta é a única que interessa aos trabalhadores, não
a luta interna numa diretoria. Isso serviria para confundir minorias com a maioria
burocrática, além de nos tornar co-responsáveis por sua política. A democracia
sindical entre tendências antagônicas é cada vez mais impossível. É preciso a
mais completa diferenciação de classe. Em geral, a defesa da proporcionalidade
hoje somente serve a propósitos aparelhistas e para a negociata com a
burocracia; nunca para combatê-la. Pressupõe o abandono da luta contra a
burocracia e a convivência pacífica
com ela.
Ao contrário disso, a proporcionalidade é um
método necessário e obrigatório para os organismos não executivos dos
sindicatos: congressos, conselhos de representantes, delegados sindicais,
comissões de negociação, comandos de greve, entre outros. Na defesa destas
proporcionalidades estaremos sempre na linha de frente. Sabemos, também, que a
direção central do CPERS não se coloca contra a proporcionalidade por estes
motivos, mas pelo controle absolutista do aparato. Nos causa estranheza o fato
das correntes que defendem a proporcionalidade não lutarem pela abertura da
imprensa sindical à contribuições da base e das correntes minoritárias, para
que novas propostas e posições possam aparecer para a base da categoria através
do Sineta e outros órgãos de comunicação. Isso possibilitaria à base influir
sobre o CPERS sem se comprometer com a política burocrática de sua direção
central.
***
Somos contra o presidencialismo. Achamos
corretas as propostas que pretendem acabar com o personalismo presidencialista
e que almejam transformar o CPERS numa coordenação colegiada. Porém, não
concordamos com a vinculação da luta pelo fim do presidencialismo com a
proporcionalidade na direção executiva.
X - Uma greve maciça, talvez
a maior e mais importante da história da categoria, se aproxima?
É assim que a Carta de Bento Gonçalves, “aprovada” no último dia do Congresso,
finaliza: ameaçando o governo com, “talvez”,
a maior e mais importante greve da história da categoria. E acrescenta: “A greve é inevitável. Cabe a nós
construirmos as condições para que seja, também, vitoriosa”[x].
Nós não esquecemos, nem por um momento, que à frente do nosso sindicato estará uma burocracia sindical que age com os métodos
descritos até aqui. E que, além do mais, manobrou para não aprovar resoluções
sobre abertura do comando e do fundo de greve, bem como da sua imprensa
sindical. O que esperar, então, de uma “greve maciça” como essa? Por tudo o que
foi descrito até aqui, temos profundas preocupações com o futuro do CPERS e dos
seus Congressos. Nenhum debate para sintetizar as nossas experiências grevistas,
por exemplo, foi feito no X Congresso. Para quem tem servido os nossos
congressos então? Será possível, assim, avançar no movimento grevista?
XI - Admirável gado novo:
uma reflexão para os Congressos do futuro!
Um dos momentos mais polêmicos e profundos do
Congresso foi a luta contra a política oficial do “eu oriento a minha base a votar contra”, gerando atritos, vaias e
“explicações” por parte da direção central através de declaração de voto.
Quando afirmamos que o sindicalismo vigente no CPERS está obsoleto e precisa
ser conscientemente superado, é por este método de funcionamento, que trata
delegados de base como “gado” em um verdadeiro curral eleitoral.
Temos plena consciência de que a comparação é
dura, porém, necessária! Num mundo onde a mentira é a regra, falar a verdade
parece provocação. Segundo Nietzsche: “Nós
somos, até a medula e desde o começo, habituados a mentir”. Como falar de
verdade o que sentimos e pensamos, onde tudo é interpretação? Foi com este
intuito que questionamos o discurso de ódio pregado pelas correntes
majoritárias (como a Articulação Sindical), que inflamavam “sua base” para
jogá-la contra outras correntes, ao mesmo tempo em que pregava a “unidade da
categoria” e falava contra Bolsonaro; propusemos, então, um debate sobre o método
e a qualidade dos votos dos delegados. Vimos, por exemplo, contratados “de
base” votar contra si próprios (ou seja, contra a efetivação) porque os
dirigentes das suas correntes e teses ordenavam, dentre outros atos deste
gênero. Até onde isso terá condições de criar um sindicalismo combativo e nos
levar a greves vitoriosas?
A estrutura da psique humana debate-se na
contradição entre o desejo intenso de liberdade e o medo da liberdade. Pensar
por si próprio dói. Se posicionar politicamente dói. É mais fácil e confortável
seguir ou ser “dirigido”, ainda que isso custe a nossa independência. Podemos
afirmar que grande parte das pessoas (e mesmo dos delegados do Congresso) não
tem clareza sobre estes processos, que se desenvolvem e se firmam de forma inconsciente
sobre a nossa conduta. Milênios de submissão, de terrorismo psicológico político
e religioso, terminaram por criar gerações de seres temerários e medrosos, mas
já é hora de quebrar a corrente!
Foi parte do nosso combate e da nossa tese
neste Congresso a luta para despertar o rebanho humano, sem o quê não existirá
sindicalismo vitorioso e, tampouco, socialismo. Queremos relembrar o melhor de
Paulo Freire e não matar seu pensamento em discursos demagógicos ou banners: “É preciso ousar, aprender a ousar, para
dizer não à burocratização da mente a que nos expomos diariamente”.
Queremos a aplicação total e profunda da pedagogia
da autonomia e o combate sem tréguas à demagogia
da submissão, afinal de contas, ninguém
é sujeito da autonomia de ninguém[xi]!
NOTAS
[i] Balanço do IX Congresso do CPERS:
http://construcaopelabase.blogspot.com/2016/07/balanco-do-ix-congresso-do-cpers_94.html
[vii] BERNARDO, João. Transnacionalização do capital e
fragmentação dos trabalhadores – Ainda há lugar para os sindicatos? Boitempo
editorial, São Paulo, 2000.
[x] Disponível em:
https://www.sul21.com.br/ultimas-noticias/politica/2019/09/congresso-do-cpers-sinaliza-greve-macica-de-professores-e-funcionarios-de-escolas-do-rs/
Nenhum comentário:
Postar um comentário