Muito
se fala sobre a necessidade de organização e trabalho de base no CPERS. Porém,
as limitações dessa organização são visíveis e podem ser analisados à luz da
experiência concreta. Hoje o CPERS está de cabeça pra baixo; há que se colocar
essa organização de cabeça para cima. Ou seja, impera no CPERS as decisões de
correntes e de indivíduos sobre a base. Ser um representante de escola não é zelar
pelas decisões da base no CPERS, mas “ser
o CPERS no chão da escola”[i].
Vejamos um exemplo[ii]:
Durante a assembleia regional de um dos
núcleos de Porto Alegre, um representante de escola levava uma posição de “sua
base” sobre a possível deflagração de uma greve. A escola era favorável à
deflagração da greve; ele, o representante, contrário. Ao perguntar à “dirigente”
do núcleo e aos poucos presentes como deveria proceder em relação a esta
contradição, ela respondeu: “vota como tu
achar que deve"!
Eis aí o resumo do funcionamento do
CPERS: a total liberdade dos “dirigentes” em relação a sua base de
representação. O sindicalismo de que precisamos é o oposto desta lógica: o
representante de escola deve votar conforme se debateu no seu local de trabalho,
procurando sintetizar todo o debate para apresentar a posição da maioria (que,
inclusive, pode ser contrária a sua). Os representantes de núcleo no Conselho
Geral deveriam proceder do mesmo jeito.
Mas
o representante de escola não terá direito de expressar sua opinião no
sindicato? Poderiam indagar alguns. Sim, ele pode expressar sua posição nas
assembleias gerais; pode explicar a sua posição pessoal na assembleia do núcleo
e, sobretudo, no Conselho de Representantes; mas, nos conselhos e assembleias
regionais, ele deveria votar conforme orientou a base pela qual foi eleito.
Caso contrário, tem que ser reeducado ou destituído.
Esta deveria ser a forma de
funcionamento dos representantes de escola. Hoje temos representantes de si mesmos ou de correntes. Desgraçadamente, não lemos nenhuma orientação sobre isso
na cartilha dos representantes de escola publicada pela direção central. Este
princípio sagrado da organização de base nem sequer é falado. Se lê apenas que
o representante é a voz da escola no núcleo, transmitindo os anseios e propostas dos colegas de trabalho ao sindicato; e o que leva as
deliberações e orientações das instâncias sindicais aos colegas de trabalho[iii]. Porém, não fala nada
sobre como proceder em relação ao voto e as deliberações. Tampouco transforma
essas decisões vindas da base como forma de funcionamento do sindicato. Assim,
o representante está livre, leve e solto. Não há seriedade nisso, o que
compromete todo o trabalho na base e a credibilidade do sindicato, que costuma
fazer o que bem entende. Da mesma forma funcionam os comandos de greve.
Certamente deve haver uma via de duas
mãos entre sindicato e escola. Muitas vezes a iniciativa deve vir do sindicato,
e não do chão das escolas. Porém, isso não pode significar jamais uma omissão numa
questão tão importante quanto à organização de base. Este tipo de funcionamento
frouxo exime as correntes de procurarem se organizar e debater no chão das
escolas, trabalhando para que o voto da base
organizada se reflita dentro do CPERS. Funciona ao contrário: a vontade do
sindicato geralmente se impõe sobre o chão da escola. Resumindo: não há
trabalho de convencimento, aproximação, escuta e discussão, apenas imposição.
Este tipo “novo” de organização pela base significa também cobrá-la de suas responsabilidades e incentivá-la a
buscar a autonomia, combatendo a noção paternalista do “sindicato fazer por
nós”.
A bem da verdade, o debate dentro do
CPERS está viciado. Ninguém escuta ninguém. As discussões são feitas a fórceps, pelo poder artificial das maiorias.
Só este triste fato demonstra a ausência de companheirismo e de humanismo freiriano (tão reivindicado em
congressos e discursos, mas nunca praticado honestamente). Para Paulo Freire,
ensinar exige saber escutar e disponibilidade ao diálogo[iv] - sobretudo em relação às
minorias. Quão distante estamos dos conselhos de Freire na nossa práxis sindical? Inverter a organização
de base do CPERS contribuiria muito para renovar e revivificar esta práxis.
Por tudo isso, a “dirigente” errou no
episódio citado. Ela deveria ter dito, sem titubear, “tu deves votar como tua escola te indicou”! Sabemos que toda
mudança é difícil, mas é possível. Nas atuais condições, uma organização de
base viva como a sugerida acima só poderia nascer de uma intervenção consciente do CPERS, que precisa estudar seriamente as
formas de aplicação e dispor de recursos financeiros para esta mudança de
paradigmas; além de intervir e combater as direções autoritárias que impedem o
livre debate sindical. Um sindicalismo voltado para as eleições e o legalismo
democrático-burguês é avesso a este tipo de organização de base. Empoderar os
locais de trabalho se tornaria um grande incômodo para esta estratégia e,
consequentemente, para a democracia burguesa. Talvez seja por isso que a
burocracia sindical fuja desse tipo de organização como o diabo da cruz.
NOTAS
[i]
Ver a cartilha dos(as) representantes de escola do CPERS: Seja o CPERS no chão da escola, publicado pela direção central –
gestão 2018-2020.
[ii]
Fato ocorrido em 2016.
[iii] Ver
a cartilha dos(as) representantes de escola do CPERS: Seja o CPERS no chão da escola, publicado pela direção central –
gestão 2018-2020 (página 5).
[iv]
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia – saberes necessários à prática
educativa. Paz e Terra, São Paulo, 2010.
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